Ao contrário do que aconteceu em 2016, quando Vítor Baía se declarou – ainda por cima na CMTV… – “preparadíssimo” para assumir a presidência do FC Porto, a recente manifestação de intenções de André Villas-Boas vir a sentar-se naquela que é, por estes dias, a sua cadeira de sonho não será motivo de grande preocupação no Estádio do Dragão. E há pelo menos duas razões para isso. A primeira tem a ver com o tempo e a segunda com o modo. Porque Pinto da Costa e os que promovem as suas candidaturas desde 1982 saberão que o próximo será, seguramente, o último mandato do decano dos presidentes de clubes em Portugal: Villas-Boas deu início à volta de aquecimento para a sucessão a Pinto da Costa, enquanto que o que Vítor Baía fez há três anos e meio foi uma claríssima falsa partida. E porque, ao contrário de Baía, Villas-Boas não colocou publicamente em causa a estrutura do clube e da SAD azul-e-branca. E isso, para a tranquilidade de quem por lá põe e dispõe, também faz toda a diferença.
André Villas-Boas disse na quarta-feira ao canal RMC Sport 1 que não quer continuar a treinar por muito mais tempo. “Penso que acabarei aos 45 [anos]. Tenho outras ambições dentro do futebol, na parte da gestão, tenho grandes ideias para o meu clube, o FC Porto, e tenho o pequeno sonho de ser presidente do clube”, afirmou o atual treinador do Olympique de Marselha, que em 2011 ganhou a Liga portuguesa, a Taça de Portugal e a Liga Europa na sua única época como treinador azul-e-branco e desde então tem feito carreira no estrangeiro. Ora, além de ter adiado a implementação da decisão para daqui a quatro anos, quando Pinto da Costa já tiver 85 anos, 42 deles na presidência do clube, e estiver a acabar mais um mandato, o 15º, que será muito provavelmente o último, Villas-Boas fez a declaração de intenções de forma mais vaga e menos crítica do que Vítor Baía, que em Janeiro de 2016 tinha sido bem mais corrosivo.
Dias depois de ter dito que se sentia “preparadíssimo” para ser presidente do FC Porto, o antigo guarda-redes foi mais longe, iniciando por um lado uma aproximação a Pinto da Costa que viria a manter quando o clube voltou a ser campeão e ele elogiou o papel do presidente nesse título, mas, por outro, distanciando-se da estrutura que estava ao lado do presidente por aqueles dias. À pergunta sobre se correria com essa estrutura no dia em que fosse presidente, respondeu de forma clara: “Era a primeira coisa que fazia”. Baía é hoje “pivot” do canal 11, projeto de televisão da Federação Portuguesa de Futebol, e não deixou de ser uma das figuras com ambições à sucessão de Pinto da Costa, mas é inegável que os que queriam desgastar-lhe a imagem com respeito a esse cenário têm tido material novo a cada ciclo noticioso.
Villas-Boas tem a seu favor o facto de andar pelo estrangeiro desde que deixou de servir os dragões e de, por isso, poder fingir algum distanciamento e não ser chamado a comentar a atualidade do clube, não gerando, por isso, anticorpos. Nomes como o de António Oliveira, ex-jogador e treinador campeão pelo clube, que tem sido colunista de jornal e comentador televisivo afeto ao dragão, devem também ser tidos em conta, até porque, mais sagaz, o ex-selecionador nacional tem gerido a sua imagem com menos ego e mais cautelas do que o antigo guarda-redes. Rui Moreira, também ele ex-comentador afeto ao clube em jornais e canais de televisão, faz um pouco a miscelânea dos dois (muito ego, mas bastante cautela e sagacidade e até algum arrojo nas relações com o clube, a quem devolveu a Avenida dos Aliados como palco de festa), mas termina em 2021 o segundo mandato como presidente da Câmara Municipal do Porto e terá naturalmente a ambição de avançar para um terceiro, até 2025.
Ora isto, somado à ideia de que a uma liderança muito forte, como inquestionavelmente é a de Pinto da Costa, sucede sempre uma liderança mais fraca, antes de chegar nova liderança forte, faz ganhar espaço a teoria de um presidente de transição: alguém de raiz mais popular e com menos capacidade ou até, possivelmente, alguém que seja apenas para queimar nos anos que se sucederão à saída de Pinto da Costa, onde será sempre muito difícil preencher o espaço imenso que há-de-ser deixado pelo atual líder. É nesse jogo de xadrez que se jogarão as eleições do FC Porto daqui por cinco anos. Porque as próximas, já se sabe, serão mais um passeio para Jorge Nuno Pinto da Costa.