O Sporting chegou a um mínimo histórico, ao cúmulo da intolerância e radicalismo de que muitos deviam envergonhar-se mas que há quem siga sem vergonha nenhuma. Àquilo que na cultura popular portuguesa se chama o “preso por ter cão e preso por não o ter”, a um momento em que o mais importante não são os factos mas sim a capacidade de os contrariar, de neles ver sinais de uma narrativa predeterminada. E a prova disso está nas reações à reintegração de Frederico Varandas no exército, onde neste momento da humanidade o presidente do Sporting poderá ser muito mais útil, na condição de médico, do que a exercer as funções de líder do clube e da SAD.
Da mesma forma que achei uma atrocidade de baixo nível haver quem quisesse aproveitar este momento para convocar eleições – e eu até era daqueles que, antes da crise Covid-19, achava que o próprio Varandas devia convocá-las, quanto mais não fosse para legitimar a sua liderança –, digo o mesmo agora dos que querem diminuir o presidente do Sporting, alegando que ele não se voluntariou, que foi antes chamado pelo próprio exército. Isto é, da mesma forma que havia quem quisesse destituí-lo por ter oferecido o seu tempo à medicina, em prejuízo do Sporting, há agora que queira diminuí-lo por não ter oferecido o seu tempo à medicina, privilegiando o Sporting, a família, o seu próprio conforto, o que seja. O problema de Frederico Varandas, no Sporting de hoje, é sobretudo um: existir.
E não devia ser assim.
Desastroso na política de composição do plantel nas duas janelas de mercado desta época, o presidente do Sporting já deu mais zigues e zagues em nove meses de condução da SAD do que deveriam ser-lhe permitidos em nove anos de liderança. Tudo isso, somado à natural má forma desportiva da equipa – até é possível ganhar com más opções, mas não é o mais natural – e ao modo como entrou em conflito com as franjas mais organizadas e militantes do clube – as claques e os saudosos de Bruno de Carvalho – levaram a que o bom-senso recomendasse as tais eleições. Porque mesmo quando se tomam boas decisões é impossível liderar contra o povo.
Isso, contudo, era antes. Entretanto, o Mundo parou e há coisas mais importantes do que saber-se se Varandas tem tempo e disponibilidade mental para preparar o regresso do clube à normalidade ou – mais ainda – se ele quis disponibilizar-se para voltar ao exército ou se foi o exército que teve de o chamar à força. É natural que, estando empenhado noutras coisas, o tempo que o presidente dedica ao clube venha a ser menos, mas certamente que haverá na organização quem o substitua. Aconteceria o mesmo se adoecesse, como pode adoecer qualquer presidente de clube neste momento.
É por isso que a prioridade, para já, não é promover o assalto ao poder, até porque a decência manda embainhar as armas e suspender os conflitos até haver pelo menos alguma perspetiva de normalidade. E isso, acreditem, ainda vai levar muito tempo.