A demissão de Ernesto Valverde e a escolha de Quique Setién para o cargo de treinador do FC Barcelona parece voltar a colocar tudo nos eixos num clube onde o estilo importa tanto ou mais do que os resultados. Pode parecer estranho que os catalães tenham demitido um treinador que é bicampeão e líder da Liga para o substituir por outro que, aos 61 anos, só ganhou uma II Divisão B e, na grande oportunidade da carreira que teve, fez um sexto e um décimo lugares com o Betis, mas há uma coisa que as pontuações não mostram: o estilo. E, para recorrer à figura de estilo utilizada no último fim-de-semana por Vítor Oliveira, Quique é um treinador do “perfume”, enquanto que Valverde é do “cheiro a suor”. Ora, tal como eu suspeitava há dois anos e meio, quando o Barça escolheu o basco para suceder a Luís Enrique, o balneário de Camp Nou não suporta maus odores.
O que pode ser apontado a Valverde? No primeiro ano foi campeão da Liga com 17 pontos de avanço sobre o Real Madrid. No segundo foi bicampeão com mais 11 pontos que o Atlético. Na atual Liga segue na liderança, ainda que com os mesmos pontos de um Real Madrid que parece ter recuperado alma com o regresso de Zidane. É verdade que as saídas da Champions foram duras de encaixar: quartos-de-final em 2017/18 e meias-finais em 2018/19, mas com eliminações depois de ter ganho por 4-1 (à Roma) e por 3-0 (ao Liverpool FC) nas partidas da primeira mão, em casa. Mas desde 2015 que o Barça não chega a uma final continental e o próprio Luís Enrique, campeão europeu em Berlim, se ficou depois dois anos seguidos pelos quartos-de-final. Portanto, por mais dura que tenha sido a desilusão, não há-de ter sido por aí.
A questão fundamental é mesmo de estilo. Por alguma razão Valverde tem como alcunha “Txingurri”, que quer dizer “Formiga” em basco e lhe foi posta por outro antigo treinador do Barça e do Athletic que simbolizava o futebol-garra – Javier Clemente. Ernesto Valverde é uma formiga e o Barça precisa de uma cigarra que continue a alimentar o conceito do futebol-champagne que faz a identidade do clube. Não fica bem a Josep Maria Bartomeu o pontapé que dá neste momento a um treinador vencedor, faz mesmo alguma confusão como é que se pode mudar tão radicalmente de perfil definido para ocupar um cargo tão importante, mas a questão é que no Camo Nou se acredita que o erro de casting foi Valverde. Por falta de estilo-Barça.
Isso, indubitavelmente, Quique Setién tem. É curioso que o Barça escolha agora um treinador que, há um par de meses, foi cogitado para substituir Marcel Keizer no Sporting e rejeitado pelo tribunal popular, por falta de resultados. Quique é o mais cruijfista de todos os cruijfistas: foi assim eleito pela Fundação Johan Cruijff em 2018. “Tudo o que sou como treinador devo-o ao muito que corri atrás da bola quando jogava contra o Barça”, explicou um dia o novo patrão de Camp Nou, que chegou a dizer a Johan Cruijff que teria dado um dedo mindinho para poder jogar na sua equipa. Não aconteceu, chega agora para a prova final. Dele, como treinador, para se ver se é capaz de funcionar a um nível mais elevado, mas também do plantel do FC Barcelona, para quem os últimos anos não foram meigos, devido à reforma de Xavi e à saída de Iniesta para o Japão. Este já não é o Barça de Xavi e Iniesta. É o Barça de Vidal e De Jong. E isso também faz toda a diferença em termos de odor.