Caso se confirme a saída de Leonel Pontes do comando técnico do Sporting, como avançou a generalidade da imprensa desportiva nacional, serão já quatro os treinadores despedidos após seis jornadas da Liga portuguesa. Mesmo em Portugal, raramente os clubes foram tão rápidos no gatilho e tão impacientes na procura pelo resultado dando tão pouco espaço a que os projetos dos seus treinadores possam florescer. Na última década, nunca tinham sido despedidos três treinadores até à quarta jornada como já aconteceu em 2019/20, nem quatro após seis rondas. No máximo foi preciso esperar até à sétima semana de competição para que se visse algo assim.
Depois de Filipe Rocha, Marcel Keizer e Jorge Silas, parece ter chegado a vez de Leonel Pontes sucumbir aos resultados aparentemente insatisfatórios. É certo que o ex-treinador dos sub23 leoninos apareceu apenas como interino, mas sem data fixada para o fim daquilo a que Frederico Varandas chamou a sua “missão”: recuperar a equipa que com o holandês Keizer não estava a carburar. Um empate no Bessa e duas derrotas com o PSV Eindhoven e o FC Famalicão parecem ter esgotado a margem de manobra de Pontes e trouxeram os nomes de Abel Ferreira (PAOK), Pedro Martins (Olympiakos), Jorge Silas e Quique Setién (desempregados) para a ribalta como hipotéticos sucessores. Parece um episódio de Game of Thrones, mas é mesmo verdade. Se o fosse, podia perfeitamente ser intitulado de “setembro negro”.
Tudo começou em Paços de Ferreira com Filipe Rocha a durar apenas 63 dias no cargo (ainda assim mais do que os infames 44 dias de Brian Clough em Leeds ou os dois de Marcelo Bielsa em Roma) e a não resistir à derrota caseira do FC Paços de Ferreira aos pés do Marítimo, na quarta jornada. Ao todo, “Filó”, como era conhecido enquanto jogador, orientou o Paços em quatro jornadas, tendo somado três derrotas e um empate durante esse período. Salvou-se a passagem à eliminatória seguinte da Taça da Liga, nas grandes penalidades, frente ao Estoril Praia.
Os despedimentos da liga esta temporada


O final da quarta jornada da liga portuguesa ditou, aliás, três despedimentos. Além de Filó, também Marcel Keizer e Jorge Silas não regressaram da pausa internacional para jogos de seleções como treinadores de Sporting e Belenenses SAD, respetivamente. Se Filó deixou o FC Paços de Ferreira na 18ª posição, pelo menos o técnico holandês sempre abandonou o Sporting com os leões instalados na sétima posição. Silas, três dias depois de Filó, dois depois de Keizer foi o homem que se seguiu, mostrando a tendência dos clubes da Liga para aproveitar a paragem para jogos de seleções e dar a tradicional chicotada psicológica no plantel. Depois do nono lugar alcançado na temporada passada, Silas não resistiu a quatro jogos sem vencer a abrir 2019/20 e, mais do que isso, a quatro jogos sem qualquer golo marcado pelo Belenenses SAD esta época.
Um caso sem igual na última década
Se em 2019/20 o quarto despedimento na liga pode ter chegado já à sexta jornada, em 2018/19, só à 15ª tal aconteceu. Rui Vitória foi o quarto despedido da temporada passada, tendo deixado o Benfica a 2 de janeiro, após a derrota por 2-0 em Portimão. Antes disso, só José Peseiro (Sporting), Cláudio Braga (Marítimo) e Daniel Ramos (GD Chaves) tinham sido despedidos na Liga portuguesa – houve outra mudança, em Vila do Conde, mas aí foi José Gomes quem quis sair para Inglaterra, com o Reading a bater a cláusula do técnico. A primeira chicotada da liga passada ocorreu já em novembro e após a oitava jornada da competição. Dois meses mais tarde do que a primeira mudança no comando técnico de um clube ocorrida em 2019/20, portanto.
Os quatro primeiros despedimentos em 2018/19


Despedimentos tão cedo na liga portuguesa não são caso isolado nos últimos anos da competição. Porém, nunca tantos em tão pouco tempo. Em 2014/15, João de Deus, então no Gil Vicente, até foi despedido do comando técnico dos gilistas mais cedo do que qualquer um dos treinadores sacrificados esta época. João de Deus deixou os minhotos ainda em agosto, após a terceira jornada da competição. O quarto despedimento nessa temporada, porém, aconteceu já em fevereiro. Ricardo Chéu, na altura demitido do FC Penafiel, durou até 16 de setembro, enquanto Domingos Paciência foi despedido do Vitória FC já a 19 de janeiro. Paulo Sérgio, o quarto a ser demitido em 2014/15, deixou o comando técnico da Académica a 15 de fevereiro.
Foi em 2011/12 que também se registou um despedimento ainda em agosto, quando Manuel Machado abandonou o comando técnico do Vitória SC a 26 de agosto, estava uma jornada da liga realizada, mas a decisão foi muito potenciada pela eliminação dos vimaranenses da Liga Europa, frente ao Atlético Madrid, num agregado de 6-0 (2-0 em Madrid e 4-0 em Guimarães) e por o Vitória ter perdido a supertaça perante o FC Porto, por 2-1. Também em 2011/12, o quarto despedimento surgiu já em dezembro.
Quatro despedimentos ainda em setembro são, portanto, um acontecimento não só raro, como único na I Divisão portuguesa na última década. Desde 2009, nunca se despediram tantos treinadores tão cedo na temporada. Mais do que isso, mesmo que Leonel Pontes acabe por ficar por mais jogos, dando tempo ao sucessor, a temporada atual já fez história pela negativa. É que mesmo três despedimentos à quarta jornada são uma anomalia.
Os quatro primeiros despedimentos em cada época na última década da liga portuguesa


O caso português é, aliás, único entre as dez ligas do futebol europeu com melhor ranking UEFA. Em Espanha, só Marcelino Toral foi já despedido tendo dado lugar a Albert Celades (Valência CF). Em Inglaterra, só Javi Gracia deu lugar a Quique Flores (Watford FC), e quer em França, na Alemanha ou em Itália (onde a paciência até costuma faltar) ainda não se registaram quaisquer despedimentos desde que a época se iniciou. Mesmo que aumentemos a pesquisa até às restantes principais ligas do futebol europeu não iremos encontrar paralelo com o que se passa em Portugal.
Tal como em três das cinco maiores ligas, também na Rússia não se registou qualquer despedimento até ao momento. A liga ucraniana acaba por ser o caso mais parecido com o português, ainda assim, dos três despedimentos já registados na competição, dois deles surgiram após a sexta jornada.
Os despedimentos ocorridos esta temporada nas dez principais ligas do futebol europeu

