A forma como Seferovic recuperou a capa de super-herói que tinha guardada no armário desde o final da Liga passada e apareceu a salvar o Benfica do embaraço a que o Rio Ave estava a tentar forçá-lo, no jogo da Taça de Portugal, demonstra duas verdades do futebol. Uma é que é importante para uma equipa que as suas segundas escolhas queiram, a cada novo ciclo, transformar-se em primeiras opções – e o Benfica de Lage não tem sido outra coisa senão isso, com uma série de jogadores a passarem, durante algumas semanas, de suplentes a imprescindíveis e vice-versa. A outra é que é importante criar condições de competitividade dentro dos plantéis para que isso possa suceder – e o próprio Lage falou sobre isso, ainda que não diretamente, quando abordou a chegada de Weigl e defendeu a lógica dos planteis mais curtos, onde todos sintam que podem jogar.
Noutro momento, quando estava a ser questionado acerca da rotatividade excessiva que levou a cabo em alguns jogos da Champions, o treinador devolveu a pergunta a um jornalista. “Qual onze-base? O da Supertaça, em Agosto? Ou o do jogo da semana passada?”. Estava a ser manipulador, porque era evidente que o âmago da questão não eram os onze mas sim alguns elementos desses onze que dificilmente podem ser abrangidos pela rotatividade nos jogos mais importantes, mas tinha razão no ponto. Este Benfica tem uma série de peças no onze que, ciclicamente, vão alternando de forma consistente. A ponta final da época passada foi dos pares formados por Florentino e Samaris, por Seferovic e Félix, por Pizzi e Rafa, por Rúben Dias e Ferro. Entretanto, os dois médios já passaram à história – Samaris ameaça agora voltar… – para dar lugar a Gabriel e Taarabt, que tinham sido dados como desaparecidos. Seferovic perdeu o lugar para Vinícius, embora a recente falta de golo do brasileiro e o súbito acerto do suíço também possam começar a fazer pensar em nova inversão da hierarquia. E a lesão de Rafa abriu caminho à imposição de Cervi, que no início da época parecia nem contar e hoje figura no onze predileto da maioria.
Não será fácil gerir as expectativas destes homens, ídolos que de repente se veem sentados sem poderem contribuir para a equipa e para o engrandecimento do próprio ego. Mas uma coisa pode sempre ser feita – garantir condições para que todos possam jogar, para que todos vão com alguma regularidade pelo menos experimentar as cadeiras do banco em vez de ficarem limitados às da tribuna. E isso faz-se com plantéis curtos, com dois jogadores por posição. Porque se, como acontece no meio-campo encarnado, onde por dois lugares lutam Weigl, Fejsa, Samaris, Florentino, Gedson, Taarabt, eventualmente Chiquinho – em jogos que é preciso virar – e anda está para chegar Bruno Guimarães, é evidente que alguns vão desmoralizar, perder o foco, tão alta é a montanha que os separa de uns minutos consistentes na equipa principal. E é por isso também que a questão do terceiro ponta-de-lança não é límpida e cristalina.
Estando neste momento o Benfica a jogar em 1+1 (Chiquinho mais Vinícius), sobra um, que é Seferovic. Podendo a equipa, a espaços, necessitar de jogar com dois homens na área, como aconteceu ontem, faz sentido que, até para se precaver de lesões, tenha uma terceira opção – lugar muito difícil de aguentar, porque muitas vezes nem ao banco vai. Raúl De Tomás, por exemplo, não o aguentou. Trazer outra estrela para competir com Seferovic e Vinícius acabará sempre por anular um dos três, o que leva à conclusão inevitável de que esse terceiro homem deve vir, isso sim, das categorias de base. É arriscado? É, sobretudo porque não se encontram alternativas claras mais abaixo. Daniel dos Anjos? Gonçalo Ramos? Mas se não fosse pela momentânea falta de opções acima, ainda hoje o Benfica não teria estreado jogadores como Ederson, Lindelof ou Renato Sanches. Muitas vezes é da escassez que nasce a abundância.