A grande questão em torno do regresso aos treinos do Nacional, primeira equipa em Portugal a fazer aquilo que muitos clubes já estão a fazer pela Europa, não é se a medida é legal ou positiva para a saúde pública. É se é inteligente e se será benéfica ao futuro competitivo do grupo. Porque legal já todos percebemos que é. À saúde pública, francamente, não aquece nem arrefece, uma vez que envolve apenas os jogadores do plantel e eles não só manterão sempre o distanciamento necessário como sairão dali para casa, sem passarem sequer pelos balneários. A minha dúvida, portanto, tem a ver com o efeito que o regresso, sem que haja data para a volta das competições, pode vir a ter no grupo. E se ele é uma forma positiva de pressão.
Na Alemanha, por exemplo, já toda a gente está a treinar. É melhor do que estar fechado em casa? Certo, sem dúvidas! Mas se pode dar um primeiro sinal de alento, porque permite aos jogadores verem caras diferentes todos os dias, aligeirar as restrições da quarentena, isso rapidamente pode também transformar-se em frustração, assim que eles perceberem que estão a treinar sem saberem bem para o quê, pois a competição não aparece. Além de que é pelo menos duvidoso que seja benéfico para uma equipa estar a treinar futebol mantendo o distanciamento – enfim, daí vem todo um novo desafio aos treinadores e aos metodólogos, que terão de desenhar mais e mais exercícios que não envolvam a aproximação dos jogadores a mais de dois metros uns dos outros. Complicado e o exato contrário do que defendem as novas metodologias de treino, periodização tática à cabeça, segundo as quais se deve treinar exatamente como se joga.
Ainda assim, o regresso do Nacional aos treinos tem a vantagem de ser uma sacudidela na monotonia, de ser aquilo a que no marketing hoje se chama um “call to action”. Porque em todo o lado se está já a fazer planos, com datas em cima. Os alemães já trabalham e por isso mesmo na próxima sexta-feira terão uma assembleia da Bundesliga para definir se o plano oficioso de regresso da competição a 9 de Maio é ou não viável. Se em Espanha ninguém se entende e a pandemia tem sido pretexto para uma guerra sem quartel entre a Liga de Tebas e a Federação de Rubiales, em França, o “L’Équipe” revelou hoje um projeto de calendário que prevê a retoma da Liga a 17 de Junho e a sua conclusão a 25 de Julho. E em Inglaterra, o “The Times” fez eco de uma proposta séria para que se jogue o remanescente da época no complexo desportivo de Wembley (13 relvados), sempre à porta fechada, depois de ser levantada a proibição de toda a atividade desportiva.
São só ideias, planos. Ninguém definiu nada de concreto. Mas um mês depois da interrupção das competições, esta é a altura de passar às ações. No caso das federações, é decidir se há ou não condições para que a época termine e quais são os prazos-limite para que ela possa chegar ao fim (o que naturalmente está intimamente ligado à calendarização da próxima). No caso dos clubes, é o que fazer com a despesa e quando voltar ao trabalho. Ninguém fala de certezas absolutas, porque infelizmente elas são ainda impossíveis. Mas as máquinas são pesadas e, depois de paradas, precisam de tempo para voltar a carburar. É assim que vejo a decisão do Nacional.
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