No dia em que a Gazzetta dello Sport fez eco da reação enérgica de Paolo Maldini contra o que considerou ser a prepotência de Ralf Rangnick, que terá exigido controlo total sobre todas as áreas antes de entrar no Milan, de forma a poder trabalhar com pessoas da sua confiança, o L’Équipe encontrou na solidariedade o segredo do sucesso da marca “treinador português”. Não vou ao ponto de afirmar que o técnico nacional é “o melhor do Mundo”, como disse em tempos Jorge Jesus, mas é evidente que há bastante mais do que cumplicidade no facto de Portugal ter cinco treinadores nos Big Five – mais uns quantos em roulement –, ao passo que, se excluirmos os que trabalham no próprio campeonato, a França só tem neste momento um, que é Zinedine Zidane, no Real Madrid. Há competência, há resultados e há uma capacidade de adaptação que, por nunca terem sentido grandes necessidades de emigrar, os franceses não têm.
Há quatro meses, o Fernando Gamito fez a pesquisa e encontrou 252 treinadores nacionais a trabalhar em 52 países. Os casos mais mediáticos são os de José Mourinho (Tottenham), Nuno Espírito Santo (Wolverhampton Wanderers), Paulo Fonseca (AS Roma), André Villas-Boas (Olympique Marselha), Paulo Sousa (Girondins Bordéus), Jorge Jesus (Flamengo) e Jesualdo Ferreira (Santos FC), mas podíamos também lembrar Luís Castro (Shakthar Donetsk), Pedro Martins (Olympiakos), Abel Ferreira (PAOK Salónica), Carlos Queiroz (seleção da Colômbia) e José Peseiro (seleção da Venezuela). E, porque não, também Leonardo Jardim, Marco Silva ou até Rui Almeida e Miguel Cardoso, que também orientaram recentemente equipas nos Big Five. Ou até Manuel José, repetidamente campeão africano, ainda que este pareça retirado das lides de forma definitiva. É muita gente em lugares de topo para se explicar de forma tão simplista como o fez o L’Équipe, que recorda mesmo o facto de, depois de sair do FC Nantes, Sérgio Conceição ter convencido Waldemar Kita, proprietário do clube, a contratar Miguel Cardoso.
Para quem cá anda, toda essa concórdia parece nunca ter passado do papel – se é que alguma vez chegou a lá estar. Quem se lembra das relações tensas entre os treinadores dos grandes, de que é exemplo máximo a frieza entre Jorge Jesus e Rui Vitória, por exemplo, não acredita no que lê. “Foi criado um conceito e uma marca, a do treinador português, e cada um mete a notoriedade ao serviço do próximo, em entreajuda permanente”, escreve o diário francês, para explicar a diferença de implantação entre “a moda do treinador português” e o facto de França ter menos de duas dezenas de técnicos espalhados pelo Mundo neste momento, dos quais só mesmo Zinedine Zidane (Real Madrid) e Valérien Ismaël (LASK Linz) contam para o totobola. “Campanhas publicitárias, utilização das redes sociais, elogio da herança cultural, vídeos e entrevistas dos melhores traduzidos em várias línguas, organização de eventos com sponsors, implementação de escritórios no estrangeiro” são as fórmulas de lobbying que o L’Équipe atribui de forma elogiosa à Associação Nacional de Treinadores para suportar esta estratégia de conquista do Mundo. Atrevo-me a dizer que José Pereira, o presidente da ANTF, nem deve suspeitar da maioria.
As razões, na verdade, são muito mais simples. As entrevistas não são traduzidas em várias línguas – o que se passa é que, regra geral, tal como os pedreiros e as porteiras que fomos exportando para França durante décadas, o treinador português desenrasca-se e entende que parte da sua formação passa por se exprimir no idioma do país que o acolhe. O resto é a competência no campo que faz: é que se ainda sou capaz de imaginar um jovem Mourinho a indicar um par de seguidores após o seu sucesso no Chelsea, francamente não estou a ver Jorge Jesus a recomendar Inácio ou Jesualdo a clubes rivais no Brasil. Depois, sim, dá uma certa ajuda que Jorge Mendes seja português e, por isso, acabe por conhecer e ter facilidade para trabalhar com treinadores nacionais, ao passo que Mino Raiola ou Jonathan Barnett, outros agentes influentes no mercado, até podem sentir essa necessidade, mas deparam-se com uma realidade em que os bons treinadores italianos ou ingleses estão bem em casa, nas equipas do seu campeonato.
A maior diferença entre os técnicos portugueses e os franceses não é o lobbying. Até aceito que possa não ser apenas a competência – embora isso esteja para ser provado. A maior diferença entre os treinadores portugueses e os franceses é que os portugueses são melhores do que o seu campeonato e procuram fazer pela vida lá fora, enquanto que os franceses estão bem instalados na poltrona que é a sua Liga. No futebol como na vida.
Nesta comparação entre Portugues e Françes, existe ainda um facto que nao devemos despresar a arrogancia francesa que leva à pouca capacidade do frances em se adaptar fora de portas. Para quem vive e acompanha a cultura francesa é facil constatar que o Frances na sua generalidade se julga no centro do mundo e pensa ser o dono da verdade, o que o leva ter mtas ideias ja feitas e a ser pouco flexivel. Claude Puel em Inglaterrra e Rudi Garcia na Rom são exemplos disso, tam como Laurent Blanc convencido que è um super treinador exige ordenados milionarios o que o leva a um jà longo desemprego…
“(…) deparam-se com uma realidade em que os bons treinadores italianos ou ingleses estão bem em casa, nas equipas do seu campeonato.”
No caso dos treinadores ingleses não me parece tão linear, já que a discussão da falta de oportunidades dos treinadores ingleses tem sido acesa nos últimos anos.
Nesse ponto de vista, sim. Mas se no nosso caso se trata de os melhores irem à procura de melhor vida, no caso inglês seria uma emigração por baixo, dos que não conseguem vaga por lá. Fica mais difícil.