Mesmo dando a possibilidade de recurso para o Tribunal Arbitral do Desporto, a derrota do Sporting na FIFA acerca dos casos de rescisões contratuais de Rafael Leão e Rúben Ribeiro, os dois “desertores” de Alcochete cujos casos restam por resolver, veio encaminhar a análise a todo este caso no sentido de se considerar que José Sousa Cintra fez bem em renegociar os contratos dos que conseguiu convencer a ficar e que Frederico Varandas também teve razão em chegar a acordos, mesmo que insatisfatórios, com os clubes que acolheram alguns desses jogadores. Essa não é, contudo, a única conclusão parcial a retirar de toda esta confusão em que o Sporting mergulhou. Porque esta é uma derrota com dois lados.
Claro que podemos agora opinar acerca da estatura moral de jogadores que rescindem por falta de condições de segurança mas depois voltam atrás se lhe acenam com mais um maço de notas. Ou até da fraqueza enquanto líder de um presidente que aceita propostas baixas por jogadores que fugiram quando poderia ir à luta, assumir o risco, e encher os cofres à conta deles… quando e se os tribunais lhe dessem razão. Tudo verdade. Nestas coisas, tendo em conta a fratura que divide o Sporting nos tempos de hoje, haverá até quem ache que o clube perdeu de propósito estes dois casos só para não ter de dar razão à estratégia anteriormente gizada em blogues cuja missão é a da criação de um “Cristo aprés la lettre” – já se fala, aliás, na desistência na contratação de um advogado que é uma espécie de Super Homem do direito desportivo. Parecem, ainda assim, absolutamente justificadas as ações de Cintra e Varandas. Porque mesmo que o Sporting viesse a ganhar os casos, ficou agora evidente que, com recursos, isso nunca sucederia antes de finais de 2021 ou até já em 2022. E os mais de 100 milhões de euros que entretanto deram entrada na SAD por via desses maus acordos terão feito toda a diferença.
Outra argumentação interessante é a da ingratidão dos jogadores que rescindiram, não se importando sequer se estavam a prejudicar o clube que os formou. Ora eu sempre fui muito frio no que toca a avaliar as relações entre clubes e jogadores, porque elas só têm de continuar enquanto houver contratos e os contratos só serão renovados se forem bons para as duas partes. A gratidão é um sentimento extraordinário pelo qual gosto de reger as minhas ações, mas não deve definir a vida profissional de cada um: da mesma forma que um clube não renova contrato a um jogador que tenha decidido um campeonato há dez anos se ele já não for capaz de render em campo, um jogador não tem de aturar tudo do clube só porque foi lá que deu os primeiros pontapés a sério numa bola. O que está aqui em causa tanto está para jogadores formados pelos leões desde tenra idade como para os que lá caíram de paraquedas meses antes dos incidentes. É a honradez ou o oportunismo – e este nem sempre é dos jogadores, mas sim de quem os manipula no mercado. É a diferença entre o que fez Rui Patrício, que até com tochas levou em campo mas que mesmo assim quis que o Sporting fosse ressarcido pela sua saída e aquilo que alguém fez em nome de Rafael Leão, que não foi sequer incomodado, porque viu no incidente uma forma de ganhar dinheiro fácil.