O que diria se, um dia, lhe dissessem que o Benfica ia jogar contra o Benfica, ou o Sporting contra o Sporting, ou o FC Porto contra o FC Porto? Em Portugal até já estivemos mais longe de ver um Belenenses – Belenenses, mas foi na Bulgária que algo semelhante se tornou realidade e, por fim, aconteceu. Com Krasimir Balakov no banco, o novo CSKA Sofia recebeu e empatou com o velho CSKA Sofia. Não é um episódio de uma série de ficção científica, mas sim a complicada realidade que enfrenta o histórico emblema da capital búlgara.
Com 31 títulos nacionais, 20 Taças da Bulgária conquistadas e presenças exclusivas no país em duas meias finais da Taça dos Campeões Europeus e uma nas meias finais da Taça das Taças, o CSKA Sofia é de longe o mais bem-sucedido clube búlgaro na história do futebol daquele país. Hoje, porém, não existe apenas um CSKA Sofia, mas dois. Uma história de enredo complicado em que dois clubes se assumem como os principais herdeiros do palmarés do gigante da capital búlgara. Uma rivalidade com quatro anos e que atingiu o pico este fim de semana com o primeiro embate entre ambos.
Fundado há 72 anos, o CSKA Sofia viveu momentos conturbados quando o domínio do futebol búlgaro deixou a capital e assentou raízes em Lovech e Razgrad. Desde o último título do CSKA Sofia em 2008 que, à exceção do título de 2009, saíram dessas duas cidades os vencedores máximos do futebol búlgaro e se os últimos quatro tiveram o CSKA Sofia como vice-campeão, há muito mais por detrás dessas classificações do que o sucesso desportivo do histórico clube búlgaro deixa antever. É que, a partir de 2016, o Litex Lovech passou a ser… CSKA Sofia.
Confuso? Normal. A história explica-se com a falência do histórico CSKA Sofia em 2016. O antigo clube militar búlgaro e máximo vencedor do futebol daquele país estava há muito afundado em dívidas e Grisha Ganchev, então dono do clube, deixou-o falir para depois utilizar a licença que detinha no Litex Lovech para destituir o clube e transladá-lo para a capital utilizando o nome, emblema e cores do histórico CSKA.
Os problemas no CSKA começaram ainda antes disso, apesar de tudo, com a debandada dos principais jogadores do clube em 2014/15. M’Bohli rumou aos Estados Unidos, Chochev ao Palermo, Martin Petrov e Todor Yanchev reformaram-se, enquanto Emil Gargorov deixou o clube em litígio com a direção. De uma assentada o CSKA perdeu os melhores jogadores do plantel anterior e o falhanço na segunda ronda de qualificação para a Liga dos Campeões perante o Zimbru Chisinau deixou o clube búlgaro em ainda piores lençóis do ponto de vista financeiro. Apesar de tudo isto a temporada até começou bem para o CSKA com a liderança por altura da paragem de inverno, mas quando este chegou, veio o caos.
O CSKA deixou de conseguir vencer jogos em 2015 e foram várias as mudanças de treinador que se seguiram. Em abril, o então dono do clube e com este em graves condições financeiras transferiu as ações que detinha e um grupo de adeptos ficou encarregue de encontrar um novo proprietário para o histórico emblema búlgaro. O CSKA terminou a temporada em quinto lugar, mas devido à acumulação excessiva de dívidas, a Liga impediu a sua inscrição nas duas primeiras divisões e atirou o gigante de Sofia para a terceira divisão.
É então em junho de 2015 que surge Grisha Ganchev na equação e a coisa até começou por entrar nos eixos. Em 2016, enquanto amadores, o CSKA venceu a Taça da Bulgária tornando-se no primeiro clube de sempre a vencer a competição jogando na terceira divisão do país, mas é nesse mesmo ano que tudo muda no futebol búlgaro. A licença detida pelo Litex Lovech da primeira divisão passou a ser detida pelo antigo CSKA e os clubes mudam de posição entre si. O Litex caiu para a terceira divisão, enquanto o CSKA ocupou o seu lugar na primeira. O clube competiu de forma pirata com o nome CSKA até que em 2018 a empresa que detém o clube passou também a ser proprietária da marca CSKA Sofia fazendo do PFC CSKA Sofia o herdeiro oficial do histórico CSKA.
Sem grande surpresa foram poucos aqueles que, no clube antigo, aceitaram de forma pacífica a extinção do CSKA e a posterior usurpação do Litex Lovech por parte de Ganchev que, entretanto, entregara a liderança do clube ao filho. A situação levou a que um grupo de membros da direção do antigo CSKA se juntasse e fundasse um novo clube, em 2016, que batizaram como FC CSKA 1948 Sofia, aludindo ao ano de nascimento do original CSKA Sofia.
Nos últimos quatro anos a ascensão do CSKA 1948 Sofia tem sido meteórica ao ponto de em 2020 o clube estar a competir pela primeira vez na primeira divisão do país depois de ter sido promovido à terceira divisão em 2017, à segunda em 2018 e à primeira em 2020, com o clube a disputar os seus jogos em casa no Estádio Nacional Vasil Levski, casa da seleção nacional búlgara de futebol. Depois de um primeiro ano na segunda divisão em que o novo CSKA falhou o play-off de promoção por três pontos, o clube ascendeu em 2020 à primeira divisão como campeão da segunda.
Para 2020/21, o novo CSKA não fez por menos e contratação o melhor jogador da história do país, o ex Sporting, Krasimir Balakov, para assumir o comando técnico da equipa, depois de uma experiência desastrosa como selecionador nacional búlgaro. A estreia na primeira divisão do país não ter sido, portanto, mais especial. Por ironia do destino e do calendário, logo a abrir a época búlgara houve confronto entre ambos os CSKA com o jogo a terminar empatado a dois golos e depois do novo CSKA, o de Balakov, ter estado mesmo a vencer por 2-0. Nasceu, assim, uma nova realidade e rivalidade no futebol búlgaro. CSKA – Slavia é coisa do passado. Agora, os olhos estão postos no CSKA – CSKA.
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