Foram cinco golos. O Flamengo de Jorge Jesus arrasou o Grêmio de Renato Gaúcho por 5-0 e, num jogo em que até lhe bastava o 0-0, perante um Maracanã lotado, assegurou a presença na final da Copa Libertadores pela primeira vez em 38 anos. No Brasil, cada vez mais se vive o tempo de Jesus, pelo impacto inegável que o “Mister” teve na realidade do futebol local, um futebol onde, com exceções, mandam treinadores atrasados na preparação e incapazes de ver as diferenças. É por isso que o local de Jorge Jesus é, para já, ali. Não há “saudades” que mudem isso.
Ontem, no final do jogo da meia-final, Jesus ainda falou do Benfica. “Cheguei para comandar uma equipa em Portugal como o Flamengo, que não ganhava títulos e hoje ganha. Um grande clube tem de ter história e títulos”, disse. E as semelhanças são tão evidentes como eram previsíveis. O trabalho de Jesus é detalhista – e ele próprio realçou no final do jogo os quatro golos de bola parada – e baseado num nível de entendimento do jogo e de intensidade total a que os futebolistas brasileiros estão tão habituados como estavam os jogadores do Benfica de Quique Flores. A mensagem não poderia passar num ápice, mas mesmo assim até chegou muito rapidamente a uma equipa que tem muita qualidade e à qual só faltava mesmo casar a ideia com a dinâmica e a exigência.
Feito isso, ao fim de três meses, o Flamengo voa. Os dez pontos de avanço para o segundo, a onze jornadas do final – e estava oito pontos atrás, quando chegou, em Julho –, não deixam grandes dúvidas de que vai ser campeão brasileiro pela primeira vez desde 2009 (e segunda neste século). A goleada de ontem assegurou a primeira final da Libertadores desde 1981, desde a equipa que tinha Zico como referência. Se ganhar esse jogo, ao River Plate, no mês que vem, em Santiago do Chile, garante a presença no Mundial de clubes pela primeira vez na história do clube, que em 1981 só havia Taça Intercontinental. E ainda que aí a oposição cresça de qualidade – lá estará o Liverpool FC, por exemplo – só isso já significa que Jorge Jesus ficará na história de um clube tão grande como os maiores da Europa. E que por mais saudades que tenha de casa, se a sua ideia é continuar a trabalhar, é ali que ele faz todo o sentido.
Claro que todo este sucesso vai centrar nele as atenções de muita gente. Mas na Europa vai continuar a ter a barreira da língua a atrapalhar. E Portugal leva-o a enfrentar outro tipo de questões. No Benfica continua a ser válido o paradigma que levou o clube a convidá-lo a sair em 2015. No Sporting nem há dinheiro que lhe pague nem condições políticas para o convidar a regressar – além de que ele próprio já tentou, ali, num clima de muito mais estabilidade, e não conseguiu ser campeão. No FC Porto, apesar da amizade e admiração mútua entre ele e Pinto da Costa, há uma questão de timings: Jesus terá de definir o futuro no final do ano, que é quando acaba o contrato, e por essa altura Sérgio Conceição estará ainda bem lançado em busca dos objetivos definidos pela equipa, que passam por campeonato, Taça de Portugal, Taça da Liga e Liga Europa. E achar que Jesus é homem para parar e desaproveitar a dinâmica que o sucesso recente criou é, claramente, não conhecer o homem.