Só oito dos 18 clubes da Liga portuguesa ainda não mudaram de treinador. Quase podem ser tratados como excêntricos. No SC Braga, a substituição de Ricardo Sá Pinto por Rúben Amorim até já valeu um título, tendo os bracarenses vencido todos os sete jogos sob orientação do novo treinador. Rúben Amorim serve, assim, de barómetro. Mas o que trouxeram as restantes chicotadas psicológicas às equipas da liga? Com exceção do SC Braga, pouco ou nada, especialmente no caso do Vitória FC e do Moreirense, mesmo tendo em conta a recente goleada dos cónegos ao Gil Vicente.
“Parece que não se sabe o porquê de se contratar determinado treinador. A estatística mundial diz que a troca de treinadores não resulta. Só cria instabilidade nas equipas, porque o problema é estrutural”, afirmou recentemente Luís Castro. E a verdade é que os números relativos aquilo que foram as “chicotadas psicológicas” em Portugal, esta temporada, validam o pensamento do atual treinador do Shakhtar Donetsk. Há por vezes uma alteração do estilo de uma equipa, um impacto emocional claro, que fica espelhado nos resultados e na média de pontos por jogo, mas raramente isso se reflete numa melhoria dos indicadores de performance das equipas, o que acaba por ter implicações a curto e médio prazo. De forma simples, a longo prazo, raramente as chicotadas a meio da temporada são sustentáveis.
Sete jogos podem não ser a amostra mais conclusiva do que pode vir a ser a carreira de Rúben Amorim no SC Braga, mas os indicadores dados na primeira “meia dúzia” de jogos sob a orientação do antigo internacional português mostram uma clara evolução do conjunto arsenalista face aquilo que sucedia com Sá Pinto. Com Amorim, o SC Braga até pode permitir (marginalmente) mais oportunidades claras de golo ao adversário (e ter jogado contra FC Porto e Sporting por duas vezes, desvirtua um pouco a análise), mas melhorou em todos os restantes indicadores de performance. Cria mais, remata mais, marca mais, sofre menos, permite praticamente o mesmo número de remates – e atenção aos adversários enfrentados – e tem uma atitude de maior domínio, ao querer ter mais bola e efetuar, de forma substancial, mais passes por jogo, em média, do que sucedia anteriormente.

O caso do Sporting é, naturalmente, dada a dimensão e popularidade do clube, o mais carismático. Foi à quarta jornada da Liga que, depois de uma derrota caseira por 3-2 com o Rio Ave, chegou ao fim a aventura de Marcel Keizer por Alvalade. Leonel Pontes ainda fez a… ponte para a chegada de Jorge Silas, algo que aconteceu a partir da sétima jornada, frente ao CD Aves. O novo técnico leonino estreou-se com um triunfo e, desde então, as melhorias face aquilo que ocorria com Keizer existem, ainda que sejam pouco significativas em grande parte dos principais indicadores de performance da equipa.
Com Silas, em traços gerais, o Sporting é uma equipa mais segura e que está mais perto do golo, apesar de ter menos urgência em atacar. Se as melhorias do ponto de vista defensivo são claras, ofensivamente, ainda assim, a diferença não é significativa. O Sporting constrói praticamente tantas oportunidades claras de golo como com Keizer, mas permite em média bem menos do que com o técnico holandês. É que se o Sporting não passou a marcar mais golos por jogo, sofre muito menos e, em consequência, acaba por ter uma melhor média de pontos por jogo do que com Keizer. Além disso, com Silas, o ataque posicional do Sporting é mais pensado, mais circular e menos vertical: os leões passam mais a bola e têm mais posse, em média. Lá está, especulando mais a posse e tendo menos urgência em atacar.

A evolução da época do Sporting:


Ainda antes do Sporting, foi a vez do FC Paços de Ferreira ter substituído Filó por Pepa, uma alteração que trouxe uma clara diferença de estilo no que ao futebol jogado diz respeito. Se em termos de oportunidades claras de golo criadas e permitidas a diferença é praticamente nula – e com Pepa, o Paços até parece mais próximo de sofrer golos -, a verdade é que os resultados têm estado mais do lado de Pepa do que estiveram com Filó: os castores tornaram-se mais eficazes nas duas balizas. Quer na concretização das oportunidades criadas, quer ao evitar as permitidas. Até porque com Pepa o Paços remata menos e é mais objetivo nas suas posses de bola, definindo melhor os momentos de decisão. Faz menos passes e tem posses de bola mais curtas.
Nota, no caso dos números referentes à performance do Paços, para a não entrada dos jogos frente ao Estoril, na segunda eliminatória da Taça da Liga, ainda com Filó, bem como dos encontros frente FC Penafiel e Sanjoanense, já com Pepa, devido à falta de dados sobre os encontros em questão. Em conclusão, ainda que a performance em termos exibicionais não seja antagónica entre Filó e Pepa, o Paços parece ter ficado a ganhar pela simples razão de ter passado a pontuar mais vezes do que vinha fazendo. Ainda que os quatro jogos realizados pelo agora técnico do Feirense sejam pouco elucidativos daquilo que a equipa podia vir a fazer no médio e longo prazo. Numa análise ainda mais pragmática, se Filó deixou o Paços na última posição, com apenas um ponto, nesta altura, à 19ª jornada, o emblema da capital do móvel é 16º e vai deixando Portimonense e CD Aves em zona de despromoção.

E é precisamente para a Vila das Aves que seguimos. A comparação entre Manta Santos e Augusto Inácio, dado o número de jogos realizados por ambos os técnicos à frente dos avenses esta época, acaba por permitir tirar melhores conclusões acerca da performance da equipa. Pelo meio, houve ainda Leandro Pires que segurou o barco entre a saída de Inácio e a entrada de Manta Santos, com três derrotas em três jogos na Liga. Pelas mesmas razões explicadas acerca dos jogos das taças do Paços, também as eliminatórias da Taça da Liga e Taça de Portugal, que culminaram ambas no afastamento avense, não foram tidas em conta.
O caso do Aves é de difícil análise. Inácio deixou o clube na última posição, com três pontos à nona jornada, e quando Manta Santos pegou no clube, à 12ª, este continuava na última posição, com os mesmos pontos. Hoje, oito jogos depois, o CD Aves continua a ser último, mas pelo menos tem já doze pontos. Manta Santos venceu três vezes, enquanto Inácio só tinha vencido uma, e por isso o registo de pontos por jogo favorece o novo treinador, sobretudo devido ao aumento da eficácia defensiva. Com Manta Santos, o CD Aves remata menos, mas remata melhor, enquanto permite mais remates e, até, melhores oportunidades de golo ao adversário, ainda que sofra menos golos. Em suma, tornou-se mais eficaz a negar as oportunidades concedidas, sendo que com Inácio permitia menos ocasiões. Curiosamente, do ponto de vista ofensivo, o Aves até cria mais oportunidades claras de golo, mas aproveita-as menos.
Além disso, o ex treinador de Feirense e Marítimo trouxe um estilo diferente à equipa, já que o Aves não faz da posse uma prioridade, fazendo menos passes e tendo menos bola em média do que acontecia com o antigo campeão nacional. Não é, por isso, claro, que o CD Aves tenha melhorado com a substituição, pelo menos no que aos dados exibicionais diz respeito. O que poderá ser um problema a médio e longo prazo.

Manta Santos chegou ao Aves depois de ter deixado o Marítimo. No Funchal, as diferenças no que ao futebol jogado diz respeito são claras: José Gomes trouxe uma filosofia de maior posse de bola e controlo do jogo com a bola nos pés, bem como um estilo de futebol bem mais associativo do que aquele que sucedia com Manta Santos. Os resultados estão do lado do novo técnico, que vai conseguindo justificar a chicotada com uma média de pontos por jogo superior à do seu antecessor, mas nem aí o Marítimo melhorou substancialmente.
Além disso, o Marítimo até passou a ser uma equipa que remata menos e permite mais remates aos adversários. Cria menos situações claras de golo, mas também permite menos ao adversário. Ou seja, com José Gomes, o Marítimo é uma equipa menos impulsiva e mais cerebral, tendo subido o nível de eficácia em cada um dos lados do campo, já que com menos golos e menos oportunidades melhorou a média pontual. Sintomático de uma equipa que passou a definir melhor os seus momentos de decisão e é defensivamente mais confiante. Nem sempre rematar menos significa atacar pior, da mesma forma que permitir mais remates não significa defender pior, se o objetivo for convidar o adversário a rematar em posições de menor probabilidade de sucesso.

Se é adepto do Vitória FC, talvez seja melhor saltar esta parte. Saboreie bem os recentes triunfos e melhoria dos resultados da sua equipa – esquecendo claro a goleada frente ao FC Porto -, já que não há nenhum indicador que permita augurar um bom futuro à equipa de Júlio Velázquez, o espanhol que substituiu Sandro Mendes no comando técnico. Velázquez entrou no clube à 12ª jornada, mas teve um batismo de fogo, defrontando o FC Porto, no Dragão, por ocasião da quarta eliminatória da Taça de Portugal. Jogo que, aliás, resultou na eliminação do conjunto verde e branco.
O Vitória FC tem sido desde então um claro caso de impulso mental/psicológico conseguido pela entrada de um novo treinador, que veio incutir uma maior confiança no grupo, mesmo que em campo a equipa até esteja mais desorganizada do que sucedia com Sandro Mendes. Não é só uma questão de estilo e dificilmente, nestes casos, os resultados acabam por ser consistentes e sustentáveis a longo prazo.
Com a entrada de Júlio Velázquez, a grande diferença do Vitória FC passou a estar na confiança à frente da baliza adversária e na frieza da finalização, já que o conjunto sadino constrói praticamente o mesmo volume de oportunidades que construía com Sandro. Além disso, a equipa passou a defender pior, não só permitindo mais remates ao adversário, em média, por jogo, como remates com uma maior probabilidade de sucesso. Com Velázquez, o Vitória FC permite em média mais oportunidades claras de golo por jogo do que fazia com Sandro e, mesmo numa análise puramente pragmática, isso percebe-se: se com Sandro o Vitória FC raramente sofria golos, com Velázquez raramente não os sofre. E nem em termos de futebol jogado a diferença é significativa, já que o Vitória tem praticamente a mesma posse de bola média e o mesmo número médio de passes por jogo do que tinha com Sandro.
A tendência, nestes casos, é que o longo prazo acabe por equilibrar as contas de forma negativa e que os bons resultados que a equipa vem tendo nas últimas semanas deixem de acontecer, uma vez que não há uma base que os sustente. Isto, claro, caso não aconteçam alterações táticas que voltem a tornar o Vitória uma equipa mais equilibrada.

No Bessa, os cinco jogos realizados por Daniel Ramos não permitem tomar uma posição definitiva acerca da “lógica” da substituição de Lito Vidigal, mas permitem pelo menos ter alguns indícios do que poderá vir a ser o “novo Boavista”. Situação idêntica no caso do Moreirense, que apenas teve Ricardo Soares nos cinco jogos mais recentes, após a saída de Vítor Campelos. À primeira vista, terão os clubes ficado a ganhar com as alterações?
No caso do Boavista os primeiros indicadores não são particularmente abonatórios para Daniel Ramos. Tudo é marginal. A equipa conquistou marginalmente mais pontos por jogo, marca e sofre o mesmo, mais coisa menos coisa, e condensa mais o jogo a meio campo, já que há menos atividade junto das balizas: remata menos e permite menos remates. O que acaba por sobressair é a segurança defensiva, já que com o antigo técnico do Marítimo, GD Chaves e Rio Ave o Boavista permite menos oportunidades claras ao adversário. É, ainda assim, claramente mais eficaz ofensivamente, já que marca o mesmo criando menos oportunidades claras de golo do que anteriormente.
A diferença de estilo, porém, parece querer ser clara, pois o Boavista passou a ter muito mais bola em média por jogo e um jogo mais associativo. O que, ainda assim, em conjunto com os restantes indicadores, parece fazer denotar uma posse de bola mais inofensiva e com menos intenção de ferir o adversário. Se Lito foi despedido precisamente devido ao estilo de jogo da equipa, com Daniel Ramos a situação não é totalmente antagónica.

Nenhuma alteração de treinador, porém, foi tão inconsequente quanto a do Moreirense, mesmo tendo em conta a recente goleada imposta ao Gil Vicente. Em nenhum indicador de performance o conjunto de Moreira de Cónegos melhorou com a contratação de Ricardo Soares e nem o habitual impacto emocional que é espelhado quase sempre na média de pontos por jogo aconteceu.
Com exceção de um aumento dos passes tentados por jogo, em nenhum outro o Moreirense se tornou numa equipa melhor, havendo por isso pouca explicação para a substituição de treinador. Ainda para mais, numa altura em que o emblema axadrezado seguia numa boa série de resultados, com apenas uma derrota nos últimos sete jogos disputados.
O triunfo folgado perante o Gil Vicente acaba por influenciar substancialmente a média de golos marcados por jogo, que até à jornada passada era inferior à do Moreirense com Vítor Campelos, o que poderá ainda assim, de forma otimista, ser visto como um possível ponto de viragem na temporada dos Cónegos. Só o médio e longo prazo dirão.

Quanto a Petit e a Bruno Lopes, que substituíram Pedro Ribeiro e António Folha no Belenenses SAD e Portimonense, a análise terá de ser feita noutro timing, já que os jogos realizados por ambos os técnicos não permitem tirar conclusões acerca do rendimento das suas equipas. Uma coisa é certa: tirando o caso do SC Braga, e de impactos emocionais em parte das equipas, no que à performance das mesmas diz respeito, as alterações de treinadores promovidas até agora resultaram pouco naquilo que é o futebol dentro de campo.
Uma preocupação para o médio e longo prazo das equipas e que não justifica totalmente a falta de paciência dos dirigentes para com os técnicos que iniciaram as temporadas nos clubes em questão e que dificulta o trabalho daqueles que os substituem já que raramente o problema está na competência dos mesmos, simplesmente o contexto é-lhes totalmente desfavorável.