2019 foi um ano de mudanças profundas Tottenham Hotspur. Poucas semanas após a presença inédita na final da Liga dos Campeões, Daniel Levy, um dos donos do clube, que tem funções executivas, decidiu colocar o ponto final num projeto que durava desde maio de 2014 ao substituir Maurício Pochettino por José Mourinho. As diferenças em termos estilísticos eram claras à partida, mas terá sido esta uma decisão justificada? Muitos indicadores de performance estatísticos tendem para o sim.
Quando José Mourinho pegou no Tottenham, a 20 de novembro, o clube londrino estava enterrado numa surpreendente décima quarta posição na Premier League, mas com o apuramento para os oitavos de final da Liga dos Campeões bem encaminhado. Na altura, eram onze os pontos que separavam os Spurs de uma posição de Champions, objetivo mínimo do clube ainda para mais depois da final alcançada meses antes. Hoje, numa altura em que as competições foram interrompidas devido à disseminação do novo coronavírus, os Spurs são oitavos e apenas sete pontos os separam do Chelsea, quarto classificado.
Em termos pontuais e posicionais a melhoria do Tottenham é evidente, mas nem sempre esse salto quantitativo é também qualitativo. Isto é, nem sempre a melhoria conseguida com a chamada “chicotada psicológica” é refletida da mesma forma na performance da equipa, como é muitas vezes traduzida em pontos. Contudo, no caso do Tottenham, a melhoria não é apenas pontual. Em termos de performance, a equipa de José Mourinho melhorou face aquilo que vinha fazendo com Maurício Pochettino.
Em termos de pontos por jogo a melhoria é clara. Com o técnico argentino, em doze partidas esta temporada, o Tottenham registava uma média de 1.17 pontos por jogo, quando com José Mourinho esse número passou a ser de 1.59 pontos por jogo. Mas nisto do futebol já se sabe: nem sempre a equipa que joga melhor ganha e muitas vezes, quando se substituem treinadores, as melhorias são mais psicológicas que técnico/táticas. A verdade, como já se referiu, é que também aí o Tottenham melhorou mesmo com José Mourinho a ter de tomar muitas decisões alternativas face à onda de lesões que o conjunto londrino atravessou nas últimas semanas.
Mais pontos por jogo, melhores oportunidades e menos chances permitidas
Com Mourinho a média de remates por jogo piorou, mas o número de ocasiões de golo não. Pelo contrário. Com Mourinho o Tottenham passou a rematar menos, mas a definir melhor as suas zonas de finalização conseguindo com isso criar mais perigo. O Tottenham tornou-se por isso uma equipa mais eficiente e mais eficaz ofensivamente. Passou de rematar 12 vezes por jogo para rematar 11, em média, mas o seu índice de golos esperados melhorou. Com Pochettino a equipa do Tottenham tinha em média 1.49 xG, passando a ter 1.60 xG com Mourinho.
O que é que isto significa? Que com Mourinho os remates feitos pelo Tottenham têm mais qualidade, isto é, são feitos em zonas do terreno onde a probabilidade de resultarem em golo é maior. Como vimos, se os remates são menos, mas o índice de golos esperados (xG) é maior, então as zonas de finalização são bem definidas e o Tottenham cria melhores situações de golo, não acumulando xG por rematar muito, mas por rematar de situações favoráveis. Ainda assim, aquém do que seria de esperar, já que desde 20 de novembro que o Tottenham é somente a nona equipa que acumulou mais e melhores oportunidades de golo na Premier League.
Mas também por aqui se vê a melhoria do jogo do Tottenham desde a substituição de Pochettino por José Mourinho. É que se com Mourinho os Spurs foram a nona equipa com maior índice de golos esperados desde que o português assumiu o comando técnico, com Pochettino os Spurs eram a quarta pior equipa da Premier League neste aspeto. Só Norwich City, Crystal Palace e Newcastle United registaram menos e piores oportunidades de golo do que o Tottenham. Com José Mourinho os Spurs passaram de uma percentagem de 12,4% de probabilidade de fazer golo por cada remate efetuado, para 14,1%.
Não foi só do ponto de vista ofensivo que o Tottenham melhorou com a chegada de José Mourinho. Também defensivamente os Spurs se tornaram uma equipa melhor. Não só o Tottenham passou a permitir menos remates, em média, por jogo, ao adversário, como acumulou um índice de golos sofridos esperados (xGA) inferior ao do Tottenham com Pochettino. Ainda assim, aqui, há um pormenor menos positivo para o português.
Se é certo que o Tottenham passou a ter um xGA inferior, esse valor surge por acumulação e não necessariamente por melhoria na organização defensiva da equipa. É que apesar de permitir menos remates, em média, por jogo, ao adversário, permite remates com maior probabilidade de resultarem em golo. Se do ponto de vista ofensivo o Tottenham define melhor as zonas de finalização, defensivamente tem tido algumas dificuldades em evitar que os adversários finalizem em zonas de elevada probabilidade de um remate resultar em golo.
Com José Mourinho o Tottenham passou de permitir 15 remates por jogo ao adversário para permitir 13, mas a probabilidade de o remate adversário resultar em golo subiu de 10,6% para 11,6%. Ou seja, apesar de permitir menos remates, permite melhores remates. Além disso, com Mourinho, o Tottenham passou de décima equipa com o melhor registo xGA da Premier League para passar a ser a 16ª. Conclusão? O Tottenham passou a ser mais eficaz ofensivamente, mas menos coeso defensivamente, um dado curioso que contrasta com o preconceito associado ao técnico português: o de ser um treinador defensivo e, mais do que isso, de ser um treinador cujas equipas defendem bem.


Números que até podiam ser explicados pelo facto de o Tottenham poder ter passado a fazer uma pressão mais intensa sobre a primeira fase de construção do adversário e com isso desequilibrar-se em ambos os momentos defensivos. Este, porém, não é o caso e tem tudo a ver com a organização defensiva pouco sólida. É que ainda que o Tottenham tenha passado de 11ª equipa que menos passes permite ao adversário por ação defensiva (PPDA), para nona, essa melhoria tem mais a ver com o contexto do que com culpa própria já que quer com Pochettino, quer com Mourinho, o Tottenham permitia cerca de onze passes ao adversário até conseguir ter uma ação defensiva. Longe dos oito permitidos pelos melhores sistemas de pressão da Liga desde então: Southampton FC, Chelsea e Manchester City.


Ora essa menor solidez defensiva quando em momento de organização é espelhada pelo número de passes permitidos ao adversário dentro do último terço de campo. Quer com Pochettino, quer com Mourinho, o Tottenham permitia em média, por jogo, cerca de sete passes ao adversário nesta zona do terreno (ODC), mas, como vimos, com os adversários a acabarem por conseguir finalizar em zonas de maior probabilidade de fazer golo desde que Mourinho chegou ao clube.
Como vimos, o Tottenham tornou-se uma equipa mais eficaz do ponto de vista ofensivo, conseguindo criar mais, com menos bola. O Tottenham passou de trocar a bola, em média, sete vezes por jogo dentro dos últimos vinte metros (DC) para trocar, em média, seis passes nessa zona do terreno, mas conseguindo com isso criar remates com maior probabilidade de fazer golo como também já vimos. (nota: contabilizados os passes completos e não as tentativas de passe)
Além disso, o Tottenham tornou-se numa equipa mais vertical e menos especulativa com bola. Com Pocchetino, os Spurs trocavam, em média, por jogo, onze passes até que o adversário conseguisse realizar uma ação defensiva (OPPDA), enquanto que com José Mourinho esse número caiu para os nove passes.


Nisto do futebol, principalmente no futebol de elite, não há necessariamente certo e errado. Principalmente, certo ou errado na forma em chegar ao resultado pretendido. Se o Tottenham fez bem ao abdicar de Pochettino em função de José Mourinho, cada um terá a sua opinião, mas o que é certo, é que numa análise pragmática aos resultados dos Spurs, Daniel Levy parece ter alguma da razão do seu lado. As melhorias não são inquestionáveis, mas que as há, há.
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