O rumor segundo a qual o futuro de Ricardo Sá Pinto em Braga dependerá dos resultados que a equipa fizer nas Taças, esta semana, casa bem com as notícias das chicotadas psicológicas no Moreirense e no Boavista, consumadas após a jornada do último fim-de-semana e a tempo de dar aos substitutos de Vítor Campelos e Lito Vidigal o tempo de conferirem às equipas o cunho pessoal durante a breve interrupção competitiva de Natal. Mas não deixa de ser estranho que tanta gente mude ou pense mudar de treinador em equipas com rendimento ainda assim acima do exigível. Boavista e Moreirense estão tranquilamente a meio da tabela, à mesma distância da linha de água que da qualificação europeia. Mudam porquê? O SC Braga tem sido uma das melhores equipas da Liga Europa. Pensa mudar porquê?
O caso do SC Braga é especial. Primeiro porque, atrás daquele semblante sempre seráfico que se vê na tribuna de honra ou nas breves declarações que faz a queixar-se das arbitragens, António Salvador é o vulcão permanentemente mais próximo da erupção que subsiste no futebol português. Depois, porque a equipa de Sá Pinto é o maior enigma da temporada: soma oito vitórias e dois empates em dez jogos na Liga Europa (e defrontando um par de vezes adversários como o Besiktas, o Wolverhampton ou o Spartak Moscovo) e tem apenas cinco jogos ganhos (com seis derrotas) em 14 jornadas da Liga Portuguesa. Por cá, como disse o próprio Sá Pinto, este SC Braga perde com equipas “que não ganham a ninguém”. E, para continuar nas duas Taças – o rumor não especificou se tinha de continuar nas duas – tem de escapar à derrota hoje, na Luz, com o Benfica (para a Taça de Portugal) e domingo, no Capital do Móvel, com o FC Paços de Ferreira (para a Taça da Liga).
Esta dicotomia é difícil de explicar a não ser por um estado de espírito: a equipa do SC Braga agiganta-se quando sente o prestígio, tem sede de glória, mas aborrece-se quando enfrenta a monotonia de mais um dia no escritório. Ganha no Molineux ao Wolves, na Vodafone Arena ao Besiktas e na Otkrytie Arena ao Spartak Moscovo mas depois perde em Setúbal e nas Aves com equipas que, à data, vinham numa longa série de jogos sem vitória. As tais equipas que “não ganham a ninguém”. Hoje apanha um Benfica em momento excelente, depois de aviar Boavista e FC Famalicão com quatro golos e o Zenit com três. Há glória na vitória. Pode é não haver poder para a alcançar.
Os casos de Boavista e Moreirense são mais típicos, mas nem por isso fáceis de explicar de acordo com uma lógica irrefutável.
É verdade que o Boavista perdeu quatro dos últimos cinco jogos, mas esses jogos incluíram as receções a Benfica e FC Porto e a saída aos terrenos do Vitória FC e do Marítimo, que tinham acabado de mudar de treinador e por isso se tornavam mais difíceis de prever e de contrariar. E as equipas de Lito Vidigal são sempre isso: uma forma de contrariar. Raramente se distinguem pelo que fazem mas sim pelo que impedem o adversário de fazer. Tal como na substituição de Sandro Mendes por Júlio Velásquez, em Setúbal, terá sido uma questão de filosofia futebolística o pavio a levar à chicotada? Mas os responsáveis do Boavista não sabiam o que tinham em casa? Não foi isso que procuraram no momento em que quiseram salvar a equipa da despromoção há um ano? Não andavam satisfeitos da vida quando o Boavista era a única equipa invicta do campeonato, à entrada de Novembro, precisamente porque era capaz de contrariar toda a gente?
Ainda assim, mais estranha é a chicotada no Moreirense. Vítor Campelos pôs a equipa a jogar o mesmo futebol positivo que já era apanágio de Ivo Vieira – não tem é os mesmos jogadores. Chiquinho, Ivanildo, Arsénio, Heriberto, Jhonatan ou Neto, todos titulares, saíram no Verão e o 11º lugar, com menos cinco pontos do que os que a equipa somava à 14ª jornada da época passada (mas a apenas dois do sétimo lugar que então ocupava) parece refletir uma campanha positiva e a caminho dos objetivos que foram delineados. Tendo em conta a escolha do substituto, que vai ser Ricardo Soares, o treinador que levou o SC Covilhã a empatar com o Benfica na Taça da Liga mas é apenas sétimo na II Liga, a ideia que fica é que em Moreira de Cónegos se procura a via inversa, a de uma equipa que seja capaz de contrariar os grandes, mesmo que depois não consiga ganhar aos da mesma igualha.