O brilhante pleno feito pelos clubes portugueses nas competições europeias deste ano é um feito digno de registo, que vai certamente permitir-nos chegar ao fim desta época à frente da Rússia no ranking da UEFA e recuperar mais uma vaga europeia a partir de 2021/22 – com duas equipas diretas e uma terceira em condições de disputar um lugar na Champions. Boas notícias, portanto. Mas, já se sabe, tudo tem um custo. E no caso português, o custo da maior facilidade em somar pontos à quinta-feira face à superior dificuldade que seria consegui-los à terça ou à quarta, vai ser o aumento dos jogos de campeonato à segunda-feira. E, porque estamos em Portugal, será ainda o incremento da suspeição de favorecimento a uns clubes e de “castigo” a outros sempre que houver quem se escude no regulamento para permitir ou impedir o adiamento de jogos.
O momento é, no entanto, de regozijo. Se Benfica e Sporting já estavam diretos nas respetivas competições, se o FC Porto viu a mudança no regulamento da UEFA permitir-lhe o acesso imediato à Liga Europa depois de ter sido eliminado na terceira ronda preliminar da Liga dos Campeões, o SC Braga e o Vitória SC foram extraordinários na forma como afastaram quem lhes surgiu pela frente para chegarmos a este pleno, que é inédito no futebol português desde que as competições estão assim organizadas. O SC Braga chega ao sorteio de hoje com quatro vitórias em outros tantos jogos, face a adversários ainda assim minimamente cotados, como são os dinamarqueses do Brondby e os russos do Spartak Moscovo. E, tendo cedido pelo caminho um empate em seis jogos – ganhando os outros cinco – o Vitória SC apresenta um score de 15-0 em golos face aos luxemburgueses do Jeunesse d’Esch, os letões do Ventspils e os romenos do FCSB, descendentes do Steaua.
O feito merece parabéns e tanto Fernando Gomes, líder da Federação Portuguesa de Futebol, como Pedro Proença, presidente da Liga, o assinalaram oficialmente, ainda ontem. Mas foi uma publicação de Tiago Craveiro, CEO da FPF, no Facebook, que me deixou a pensar no lado mais obscuro da proeza. “Quase 30 por cento dos clubes da Liga jogarão também na Europa, pelo menos até final do ano”, escreveu. “Todos devemos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para os ajudar a todos a serem bem-sucedidos”, seguiu Craveiro. E, face à polémica recente a propósito do calendário, que encaixou um Benfica-FC Porto entre as duas datas nas quais os portistas poderiam ter tido de jogar com o Olympiacos o acesso à fase de grupos da Champions, esta frase já pode ser vista como uma espécie de manifesto a favor da submissão do calendário da Liga nacional aos interesses dos “europeus”.
Porque gerir é antecipar problemas, a Liga já devia estar a pensar no que vai fazer. Tem uns dias – até à próxima reunião da Comissão de Calendários – para evitar escudar-se no que diz o regulamento, que será a resposta mais provável. O que não será é uma resposta proativa, face a um problema criado pela UEFA e pelos operadores de televisão, que resolveram encher as quintas-feiras de futebol internacional. Ora, o que diz o regulamento de competições é que haverá sempre direito a um intervalo de 72 horas entre jogos, a calcular entre a hora de início de um e o pontapé de saída do outro. Estabelecem-se depois algumas exceções, como a dos clubes que tenham de jogar no estrangeiro à quinta-feira – o que à partida será sempre o caso de pelo menos dois dos nossos quatro participantes na Liga Europa. Nesse caso, não havendo acordo escrito, o intervalo de 72 horas passa a contar entre o final de um jogo e o início do outro. O que é preocupante em termos de Liga portuguesa é que isto vai transportar boa parte das jornadas que se sucedem às rondas europeias para o fim da noite de domingo ou, até, porque muitas vezes existirão acordos escritos – levantando outra lebre, que é a do tráfico de influências entre clubes, que permitem o adiamento de jogos a uns e depois não permitem a outros – para as segundas-feiras.
A má notícia de ontem foi esta e afeta os adeptos que ainda gostam de acompanhar as suas equipas nas deslocações nacionais. A boa foi para os operadores televisivos, que passarão a ter futebol em direto para mostrar sete dias em sete da semana.