Os penaltis por mão na bola têm sido a principal polémica no arranque da Premier League nesta época. Chovem críticas às novas leis, com muitos a acreditarem que a essência do futebol inglês está em causa. Nas três jornadas já disputadas houve seis grandes penalidades assinaladas por mão na bola, algumas até decidiram o desfecho de partidas, quando na totalidade da temporada passada só foram apitadas 19 – caso se mantenha a média nesta temporada, o total chegará perto das 70. Depois de jogadores e treinadores mostrarem o seu desagrado, a Liga Inglesa decidiu dar agora maior liberdade aos árbitros na interpretação das regras, alteração que foi apoiada pelo IFAB (International Football Association Board), organismo que tutela as leis do jogo.
As críticas subiram de tom na sequência do jogo que viu José Mourinho abandonar o relvado rumo aos balneários ainda antes do apito final. Foi a receção do Tottenham ao Newcastle United, que terminou empatada a uma bola, com os magpies a chegarem à igualdade aos 90+7’, com um penálti assinalado a Dier por mão na bola. O internacional inglês disputava a bola nas alturas com Carroll, quando a bola desviou no jogador do Tottenham após um cabeceamento do avançado do Newcastle. Dier estava de costas para o esférico e a escassa distância da posição em que a bola foi cabeceada, o que motivou uma roda viva de protestos. Nada tinha sido assinalado prontamente, tanto que o árbitro até apitou para o fim do encontro, mas após consultar as imagens do VAR Peter Bankes apontou para a marca dos onze metros .
“Estamos todos na mesma página, algo tem de mudar. No meu caso, se olhas para a situação como um todo, a falta que precede o livre, a distância entre mim e o Carroll, o facto de que sou empurrado pelas costas, algo que as pessoas não estão a falar. O empurrão por trás é o que faz o meu braço subir, é uma reação completamente natural, se alguém te toca assim a reação normal é essa. Mesmo sem o empurrão, ele está menos de um metro atrás de mim e não sei o que mais se pode fazer. Não se consegue saltar sem as mãos, nem defender sem usar os braços para o balanço e mover-se”, disse Dier em declarações ao ‘Football Focus’ da BBC, após a partida, sobre o lance que pode ver abaixo.
O primeiro caso de burburinho do passado fim de semana tinha acontecido no jogo entre o Crystal Palace e o Everton. Os toffees ganharam por 2-1 e o golo do triunfo apareceu de penálti. Ora, a falta foi assinalada a Joel Ward depois de um cabeceamento de Digne ter ido diretamente à mão do defesa dos eagles, que até tinha o braço numa posição vertical (ver vídeo abaixo). Após verificar o VAR, o árbitro Kevin Friend apitou a grande penalidade, o que deixou Roy Hodgson, treinador do Palace, completamente furioso. O técnico considerou mesmo que estas novas leis estão a “matar o jogo”. Steve Bruce, timoneiro do Newcastle, concordou, apesar de a sua equipa ter beneficiado do tal penálti frente ao Tottenham. “Consigo entender o porquê dos spurs terem ficado furiosos e o Roy Hodgson ter reagido daquela forma. É um absurdo total, talvez o Roy tenha razão e precisemos de nos juntar todos. As decisões estão a arruinar o espetáculo.”
Todo este alarido surge neste arranque de temporada, pois só agora é que a Premier League apertou no rigor máximo das novas leis de mão na bola. As regras já estavam aplicadas nas restantes ligas em 2019/20, mas em Inglaterra começaram a ser implementadas aos poucos e havia ainda muita liberdade para os árbitros decidirem pela sua consideração, o que já não é assim. A IFAB apertou os critérios e definiu a fronteira entre o ombro e o braço como a base das axilas. Tudo o que seja abaixo daí é considerado falta, seja intencional ou não, independentemente da direção da qual a bola vier (já nem precisa de estar a impedir uma oportunidade de golo) e na qual o jogador em questão está virado. O organismo tutelou também que deve ser assinalada infração por mão/braço na bola quando o jogador tornar o seu corpo “maior de forma não natural” e/ou puser os braços acima da altura do ombro. Ficou ainda definido que uma mão na bola “acidental” por um jogador atacante é somente falta quando ocorre “imediatamente” antes de um golo ou uma oportunidade clara de golo.
Estas novas leis à questão da mão na bola aumentar o número de grandes penalidades assinaladas nas principais ligas europeias que as adotaram logo na temporada passada. No campeonato italiano, o número de penaltis por mão na bola aumentou de 37 para 57 em 2019/20 em Espanha passou de 35 para 48. Em solo alemão houve adaptação mais rápida da parte dos jogadores e apesar de um ligeiro aumento nos primeiros tempos, o registo ajustou-se e começou a baixar. As seis grandes penalidades já assinaladas por mão na bola nesta Premier League corresponde a 30 por cento de todas as penalidades cometidas (20). Desde 2006/07, a maior percentagem de penaltis por mão na bola foi de 21,1 por cento em 2008/09, número abaixo daquilo que se tem verificado neste começo de temporada.
Este aumento também tem por base o surgimento do VAR no mundo do futebol. Os árbitros têm agora ferramentas para analisar ao pormenor e de todos os ângulos os lances, mesmo que as decisões por vezes não sejam as mais acertadas aos olhos de muitos. Para além disso, a FIFA também deu indicações a todos os países para levarem a cabo as medidas restritas de forma a que as decisões tenham o mesmo critério em todos os campeonatos. A Liga Inglesa só nesta época o faz completamente, como com outras situações, por exemplo o adiantamento dos guarda-redes nos penaltis.
Na passada terça-feira ficaram decididas ligeiras alterações à lei da mão na bola, de forma a providenciar os árbitros com maior liberdade na interpretação da regra e dos lances em análise. A medida já está a ser levada a cabo na quarta jornada da Premier League, que decorre este fim de semana, e o sentimento em Inglaterra é que a estratégia seja para continuar. Isto pois o próprio IFAB deu a autorização. A principal mudança é que em vez de verificarem por posições “não naturais” dos jogadores, os árbitros passarão a considerar se é ou não suposto um jogador ter os braços em determinada posição pela forma como têm o corpo, ou a maneira que estavam a discutir o lance com os adversários. As infrações por mãos/braços acima do ombro continuam intactas e não sofrem qualquer alteração.
Curiosamente, mesmo com esta liberdade dadas aos árbitros, a grande penalidade assinalada a Dier até tinha de ser mantida, visto que o jogador do Tottenham tinha o braço acima da altura do ombro. O internacional inglês que até foi uma das vozes mais críticas que culminaram com esta alteração. Ainda assim, noutros casos a situação já seria revertida. O penalti assinalado a Joel Ward no encontro entre Crystal Palace e Everton já não seria considerado infração, assim como o de Lindelöf na derrota do Manchester diante do Palace por 3-1. Resta esperar para ver se o número de penaltis por mão na bola começa a descer, ou se esta é uma tendência que não tem forma de ser evitada, nem mesmo com maior liberdade do que noutros campeonatos.
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