Numa altura em que os campeonatos estão prestes a sofrer a primeira interrupção mais larga, devido à realização de duas jornadas da fase de qualificação do Europeu de 2020, tem havido debate à volta da maior acumulação de jogos das equipas envolvidas nas rondas preliminares das competições europeias. E quando isso acontece voltam sempre as teses em torno do bem que faria reduzir o campeonato para aligeirar a carga competitiva ou de como a defesa do interesse nacional deveria levar à proteção de quem anda a batalhar por representar Portugal nas provas da UEFA. Ora, mesmo admitindo que há aspetos a melhorar, devo dizer que não subscrevo nenhuma das ideias.
O mais discutido em Portugal, por força da intervenção de Pinto da Costa, tem sido o facto de não haver proteção aos europeus no sorteio do calendário da Liga. Queixava-se o líder portista de ter tido de jogar o clássico com o Benfica num sábado que ficaria encaixado entre os dois jogos do play-off da Champions, ao qual o clube só não acedeu porque entretanto tinha sido eliminado pelo FK Krasnodar. Da mesma forma que, lembraram-me alguns leitores de memória mais fresca, já se queixara Rui Vitória há um ano, por ter sido forçado a encaixar o dérbi com o Sporting entre os dois jogos com o PAOK que definiram o futuro do Benfica na mais importante competição europeia. Tal como certamente se queixarão responsáveis do Vitória SC ou do SC Braga, que terão de jogar com FC Porto e Benfica já no domingo, três dias apenas após a conclusão das suas importantíssimas eliminatórias contra o Steaua e o Spartak Moscovo.
A questão em torno da proteção a clubes europeus no início das Ligas é que ela acaba por não ser justa para os outros – e um campeonato deve ser o mais justo possível para todos. Além de retirar ao arranque das provas focos de superior interesse, como indiscutivelmente foi o Benfica-FC Porto de sábado, essa proteção iria castigar mais ainda os clubes mais fracos, aumentando-lhes a probabilidade de terem de jogar com os colossos logo no arranque – o que lhes condicionaria a preparação da época. Portanto, não, não acho que esse seja uma boa medida, da mesma forma que discordo do adiamento de jogos para outras fases da época só para que as equipas encarem os confrontos europeus de forma mais tranquila: uma das razões para o sucesso popular do futebol é ser um desporto fácil de compreender e de discutir e olhar para uma classificação onde há muitas equipas com um total diferente de jogos feitos não ajuda a essa popularização.
Isto não quer dizer, contudo, que não haja aspetos a melhorar neste tema. O problema é que, à exceção da idiotice que foi obrigar o Vitória SC a jogar a segunda eliminatória da Taça da Liga, da qual estavam isentos os outros quatro europeus, quase todos esses aspetos iriam mexer com a dimensão televisiva do futebol, que é de onde vem o dinheiro, porque é também a que leva o futebol à generalidade dos seus espectadores. É a TV, com a obrigatoriedade de distribuir os jogos europeus por vários dias da semana, que vem introduzir aqui um fator de dificuldade acrescida. Apesar de tudo, na época passada, o Benfica não teve a dificuldade que o FC Porto viria a ter caso tivesse passado o FK Krasnodar e se visse a jogar com o Olympiacos pelo acesso à Champions, porque se há um ano os encarnados tiveram oito dias entre os seus dois jogos com o PAOK, desta vez os dragões teriam tido apenas seis de intervalo entre as partidas com os gregos. Da mesma forma que, vendo os jogos da Liga Europa empurrados para quinta-feira, o Vitória SC e o SC Braga veem reduzido para o mínimo regulamentar o período entre as partidas do play-off e os seus desafios da quarta jornada da Liga portuguesa, que os trabalhos das seleções impedem que sejam passados para segunda-feira. E ainda bem, que isso do futebol à segunda-feira à noite é outra questão de interesse dos operadores de TV que não beneficia em nada o jogo ou os adeptos.
Portanto, a questão não é de excesso de jogos no calendário – o que me leva a achar também que reduzir o total de participantes na Liga não resolveria nada, limitando-se apenas a reduzir o total de jogadores com potencial a poderem chegar aos palcos mais mediáticos. O problema é, isso sim, de organização desse calendário. Estivessem os jogos europeus concentrados à quarta-feira – ou no limite à terça e à quarta, para os clubes envolvidos poderem jogar à sexta e ao sábado no fim-de-semana anterior e ao domingo na ronda seguinte – e tudo seria bem mais suportável. Sim, haveria menos serões de futebol na TV. Os espectadores teriam mais escolha num dia e menos emoção noutro. Mas ao ponto a que chegámos começo a achar que até isso seria uma coisa boa.
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