Não foi surpreendente o conjunto de medidas anunciadas ontem pela UEFA, no seguimento da Assembleia Geral extraordinária destinada a encontrar formas de combater a inatividade a que o futebol foi condenado pela pandemia do Covid-19. A prioridade, depois de assegurada a saúde e o bem-estar de todos, terá sempre de ser a base de tudo e a base é a competição nacional – sem campeões nacionais não há competições europeias, sem competição regular dos jogadores pelos clubes não há futebol de seleções. A questão aqui é a de entender se mesmo este plano de contingência não será demasiado otimista.
Çeferin não se atreveu a lançar datas para cima da mesa, mas já todos percebemos que se está a trabalhar com calendários particularmente apertados. Para se concluírem as provas nacionais e europeias de clubes até 30 de Junho, data de final de contratos de muitos jogadores, mesmo que se passe a jogar duas vezes por semana, entre Ligas nacionais e provas europeias, seria sempre necessário recomeçar em inícios de Maio. E ninguém acha que as equipas sairão deste período de quarentena num dia e prontas a competir no dia seguinte – haverá sempre a necessidade de algum período de preparação, até para proteção dos próprios jogadores contra lesões. Ora isso leva a que este plano só seja viável se a quarentena acabar em meados de Abril.
O plano da UEFA precisa, portanto, que num mês a contar a partir de agora se consiga conter o Covid-19. O que me parece particularmente difícil, sobretudo tendo em conta que há países bastante mais atrasados do que outros na disseminação da doença e que, provavelmente, vão experimentar curvas de infetados semelhantes às dos países que já têm muita gente doente, mas que por isso mesmo deverão ser os primeiros a ver essas curvas entrar na fase descendente. Claro que, mais a mais numa altura em que é importante passar para o Mundo uma mensagem de esperança, não se pede à UEFA que venha ser a profetiza da desgraça, mas os poderes do futebol têm de começar já a conversar com os poderes políticos e a falar em sede de concertação social, para que se crie um regime de exceção nos temas contratuais e se preveja a possibilidade de a época ter de se prolongar para lá de 30 de Junho.
E, sendo também claro que neste momento o poder político tem muito com que se ocupar, que a crise vai ser uma realidade em todas as indústrias, teve razão Pedro Proença, presidente da Liga Portugal, no alerta que lançou ao Primeiro Ministro, António Costa, recordando-o que o futebol “não é um Mundo à parte”. O futebol não é só o Cristiano Ronaldo e o Messi. Não é só o Real Madrid e o Bayern. Não é só o dinheiro do Catar no Paris Saint-Germain ou dos fundos chineses no Inter. O futebol tem muitos trabalhadores remediados. Tem muita gente que trabalha nas suas franjas que vai passar mal com a interrupção do negócio. Porque se a UEFA e até a FPF não correm risco de fechar portas por conta d os milhões que lhes vai custar o adiamento por um ano do Europeu-2020, os clubes do meio da tabela da Liga portuguesa – e já nem falo dos das divisões secundárias – não vão ter como pagar salários aos jogadores quando ficarem sem fonte de receita.