Emprestar jovens jogadores da formação a clubes estrangeiros, como o FC Porto fez com Diogo Queirós, que foi jogar para o RE Mouscron, da Bélgica, não costuma dar grandes resultados, mas torna-se cada vez mais necessário, dadas as limitações a este tipo de cedências entre clubes da I Liga. Nos últimos dez anos, são raros os casos de miúdos que regressaram à casa-mãe após uma época de cedência, tornando-se apostas regulares na equipa principal. Tobias Figueiredo e William Carvalho foram as exceções à regra, num mundo em que os clubes fazem o que mais lhes convém, mesmo que tenha impacto negativo no futuro de potenciais talentos. Diogo Queirós, que na sexta-feira passada se estreou como titular no onze do RE Mouscron que foi empatar fora (2-2) com o KV Mechelen, tem a missão de conseguir o que poucos fizeram antes dele.
O defesa-central de 20 anos é visto como um dos maiores diamantes por lapidar a sair da formação do FC Porto e foi somar minutos para o campeonato belga. É precisamente aqui que entra uma questão pertinente: seria mais proveitoso colocar o defesa a rodar na Liga Portuguesa, num país e cultura que conhece? Quem olha para o resultado dos mais sucessivos empréstimos em anos recentes verifica que sim. São mais os jogadores cedidos a equipas do nosso país que conseguiram um lugar no plantel principal de um dos três grandes logo na época seguinte ao empréstimo.


Quem passou por ambas as situações foi André Marques, defesa-esquerdo já retirado da prática futebolística. O ex-Sporting diz que a melhor opção é mesmo um empréstimo a clube português. “O mais importante é jogar, seja no estrangeiro ou internamente. Em Portugal, penso ser a melhor solução, até porque estão mais visíveis para o clube de origem”, disse-nos.
O antigo lateral passou por vários empréstimos a clubes portugueses, mas foi no Vitória FC, em 2008/09, que acabou por ganhar o estatuto que o levou a um lugar no Sporting da temporada seguinte. Em 2009/10 ainda realizou dez partidas de leão ao peito, mas foi novamente cedido para o Iraklis, da Grécia. Por lá fez apenas um encontro e não mais voltou a conseguir figurar no plantel principal leonino. Um dos fatores que aponta como problemático em cedências para o estrangeiro tem a ver com a cultura do país de destino. “O outro aspeto tem a ver com a adaptação ao país e cultura. A sair, tem de ser sempre bem ponderado.”
William e Tobias como exceções à regra
A ida de Diogo Queirós para o campeonato belga dá que pensar precisamente devido à escolha do destino. Porém, empréstimos a emblemas belgas até já resultaram, ainda que não no curto prazo. O caso mais evidente é o de William Carvalho. O agora internacional português alcançou um papel de destaque no Sporting em 2013/14, tendo antes estado emprestado ao Cercle Brugge. O médio esteve durante uma temporada e meia por lá, já depois de alguns meses cedido ao CD Fátima. Renato Neto, por seu turno, foi a jogo com a camisola verde e branca em onze ocasiões durante 2011/12, após um ano e meio no segundo clube da cidade de Brugge.


Outro caso de sucesso é o de Tobias Figueiredo. Emprestado ao CF Reus (Espanha) em 2013/14, o defesa passou a temporada seguinte a deambular entre a equipa principal e o conjunto secundário do Sporting, mas ainda realizou 20 encontros entre as primeiras escolhas. Formado no emblema leonino, o central acabou por não ser capaz de ascender a figura de destaque e mais tarde voltou a deixar Portugal, mais precisamente para rumar ao Nottingham Forest, onde ainda está.
Diogo Queirós tenta inspirar-se no caso do colega de setor para sonhar com um lugar no plantel principal do FC Porto em 2020/21. Ainda assim, o jovem de 20 anos tem de tomar precauções e preparar-se para a possibilidade de esta ser apenas uma primeira cedência. Os sucessivos empréstimos de jovens acontecem com regularidade, como salienta André Marques. “O facto de os jogadores que saem não voltarem é muito frequente. E acabam por não singrar. A teoria de que o jogador é emprestado para regressar não é totalmente verdade. A maioria não retorna e cumpre toda a duração do contrato com sucessivos empréstimos”, diz-nos o ex-jogador.
Parceiros de negócio e libertação de encargos salariais
Uma das explicações que se encontra para os empréstimos a clubes no estrangeiro são as parcerias muitas vezes efetuadas entre dois clubes. Seja satélite ou apenas um acordo para troca de jogadores, são inúmeras as ocasiões em que isto leva à cedência de atletas excedentários num plantel ou então a que os jovens dêem os primeiros passos no futebol sénior lá por fora. Os encargos dos salários também representam um fator importante. “Muitas vezes os jogadores são emprestados porque há poder financeiro da outra equipa, o que convém ao clube de origem que assim fica sem esse encargo [salário], suportado pelo clube que recebe o atleta. Essa solução muitas das vezes não é a melhor para o atleta, mas convém bastante ao clube”, considera André Marques.
Contrariamente àquilo que acontece nos empréstimos de jovens a clubes estrangeiros, até existem uns quantos casos de sucesso em cedências a emblemas portugueses. Mais recentemente, André Pereira foi a jogo 22 vezes com a camisola do FC Porto na época passada, depois de alguns meses no Vitória FC. Dragões à parte, tem sido o Sporting quem mais sabe aproveitar este processo: Podence (18 jogos pelo Moreirense e 13 no Sporting em 2016/17); Esgaio (16 partidas na Académica em 2013/14 e 13 pelo Sporting na temporada posterior); Cédric (23 encontros ao serviço dos leões em 2012/13, na sequência de cedência à Académica); Adrien ganhou titularidade no Sporting após dois empréstimos consecutivos à Briosa; André Martins disputou 20 compromissos de leão ao peito em 2011/12, depois de estar emprestado a Pinhalnovense e Belenenses no ano anterior. No Benfica, André Almeida realizou 34 jogos pela equipa principal em 2012/13 na sequência de uma cedência à UD Leiria.
Assim, é percetível que nos anos mais recentes a aposta em empréstimos a clubes portugueses tem tido mais resultado no que diz respeito a jovens dos três grandes. O surgimento das equipas B também é uma forma de efetuar o ritual de passagem das camadas jovens para os seniores, mas entende-se a opção das cedências, para que os jogadores possam adquirir ritmo e competição em escalões principais, com adversários mais experientes e de maior qualidade. Certamente que Diogo Queirós irá somar vários minutos em campo no decorrer desta época, com a camisola do RE Mouscron. O que fica a pairar no ar é a possibilidade de vermos o jovem central a ser escolha regular no FC Porto em 2020/21. Como aqui fica evidenciado, as probabilidades são baixas, mas cabe ao jogador e muito ao clube criar mais uma exceção à regra.