Tido por uns como um dos segredos do sucesso do Atlético de Madrid dos últimos sete anos e desvalorizado por outros, que o consideram um simples homem de mão de Jorge Mendes, ali colocado para facilitar o carrossel, o italiano Andrea Berta anda nas bocas do Mundo desde que chegou à capital espanhola, deixando para trás um currículo sempre a subir no futebol italiano. Esta semana voltou a falar-se do interesse nos seus serviços do Manchester United, clube onde o nome do diretor desportivo colchonero já tinha sido discutido aquando da passagem de José Mourinho por Old Trafford. Mas a sua habitual discrição face aos meios de comunicação – não se lhe conhece uma entrevista em 20 anos de carreira – tem o evidente contraponto nas muitas vezes que é falado para outros clubes: além do United, desde que está em Madrid já foi dado como alvo de Paris Saint Germain, AS Roma, Milan, Inter Milão e SSC Nápoles. E nunca se mudou, alegadamente porque a mulher, Miriam, e a filha, Paola, gostam da vida na capital espanhola.
Andrea Berta nasceu em 1972, em Orzinuovi, a de 30 quilómetros de Brescia, na Lombardia. Embora haja notícias de que chegou a jogar futebol como profissional, nada disso se confirma. A paixão pelo jogo desenvolveu-a como responsável pelo Rodengo-Saiano, uma das equipas que participava nos torneios populares que marcavam as noites estivais da zona, ao mesmo tempo que trabalhava como empregado bancário no Crédito Corporativo de Pompiano, uma localidade que fica a meio caminho entre Orzinuovi e Brescia. Foi nessas noites de futebol que Berta conheceu Lorenzo Moneta, primo do treinador Cesare Prandelli, que mais tarde veio a ser selecionador italiano, e primeiro nome importante na carreira do atual diretor desportivo do Atlético Madrid. Moneta tinha Berta em tão alta consideração que, quando Tommaso Ghriardi comprou a AC Carpenedolo, clube da região que acabara de subir à Série C2, não hesitou em recomendá-lo. E Berta queria tanto fazer vida no futebol que, aos 30 anos, também não hesitou em aceitar o cargo de diretor desportivo, para enorme preocupação da mãe, que preferia vê-lo seguro, atrás do guichet do banco, num trabalho que não fosse tão instável como o futebol.
Berta fez um trajeto de sete anos ao lado de Ghirardi, que atualmente, no entanto, nem pode ouvir falar dele. A parceria durou até 2009, já o empresário era dono do Parma Calcio – para onde, em 2007, levou Berta. Nessa altura, Ghirardi optou por substituí-lo por Pietro Leonardi e ainda não se arrependeu. “Por favor, não façam comparações entre Berta e Leonardi ou eu ainda caio da cadeira. Dizer que Berta está no Atlético de Madrid é um exagero… Ou melhor. Ele está lá, de facto. E está a fazer alguma coisa, mas não sei especificar exatamente o quê”, disse recentemente Ghirardi. Nunca nenhum dos dois falou acerca do que correu mal, mas há várias suspeitas: desde rumores de falta de solidariedade, por causa de contratações que Berta desaconselhou mas que o presidente quis na mesma fazer, à incapacidade do diretor desportivo para lidar com um balneário onde se impunham alguma autoridade e capacidade de gestão de conflitos, facetas nada compagináveis com o seu feitio introvertido e reservado. E as coisas entre os dois até começaram bem. Na AC Carpenedolo, por exemplo, conseguiram sempre a manutenção no quarto escalão italiano até se mudarem para Parma. Ali, depois de também terem conseguido segurar-se na Série A na primeira época, 2006/07, veio a descida de divisão, em 2008.
Apesar do sucesso na campanha de 2008/09, na Série B, premiado com o regresso ao escalão principal, a mensagem já não passava. Foi público que Berta não quis responsabilizar-se pelas contratações de Reginaldo (ex-Fiorentina, em Julho de 2007) ou Lucarelli (ex-Shakthar, em Janeiro de 2008), por exemplo, não surgindo sequer ao lado do presidente nas respetivas apresentações. Daí que em Setembro de 2009 o Parma tenha contratado Leonardi e Berta tenha seguido para o Génova CFC. Foi nos três anos que passou clube de Enrico Preziosi que o atual diretor desportivo do Atlético Madrid começou a destacar-se pelo olho que tinha para as contratações. “Berta é um campeão capaz de encontrar sempre jogadores importantes sem gastar muito dinheiro. Ele faz milagres”, considera Dario Canovi, um dos empresários mais influentes do futebol italiano, que antes de Berta se comprometer com o Génova CFC tentou colocá-lo no Siena.
As aquisições de Veloso, Kucka ou Antonelli, em 2010, ou de Granqvist e Birsa, em 2011, são apontadas como sucessos pelo que os jogadores deram ao clube. E mesmo que se lhe possam apontar algumas vendas em saldos, como a de Sokratis Papastopoulos, por exemplo, vendido ao Werder Bremen por apenas 3,5 milhões de euros, seis anos antes de ter saído de Dortmund para o Arsenal por 16 milhões, foi em Génova que Berta começou a traçar as linhas daquilo que viria a ser o seu futuro. Ali, patrocinou várias transferências envolvendo clubes portugueses: além de Veloso (ex-Sporting), contratou Eduardo ao SC Braga, Diego Ângelo à Naval e acolheu Belluschi, emprestado pelo FC Porto, mas também vendeu Zapater e emprestou Ribas aos leões, assinando ainda a cedência do mesmo Eduardo ao Benfica. Não foram negócios de estalo? Pois não. Até houve ali mais fracassos do que sucessos. Mas terão sido o suficiente para que, quando Peter Kenyon – ex-homem forte do Manchester United e do Chelsea – o recomendou ao Atlético Madrid, Jorge Mendes tenha, ao que se diz, dado o visto bom. O que, em operações que envolvam o Atlético de Madrid, já se sabe, faz toda a diferença.


Berta chegou a Madrid em Maio de 2013, como diretor técnico, homem de mão de Diego Simeone. É, desde 2017, um diretor desportivo plenipotenciário, tendo ganho em Dezembro último o prémio de diretor desportivo do ano nos Globe Soccer Awards, no Dubai. À sua chegada, de acordo com o Transfermarkt, o plantel dos colchoneros valia 257 milhões de euros, ao passo que hoje atinge os 709 milhões. Claro que para isso contribuíram algumas aquisições sobrevalorizadas, como a de João Félix, por 126 milhões de euros, mas também várias apostas certeiras em jogadores recomendados pelo italiano. Oblak, contratado ao Benfica em 2014 por 16 milhões de euros, é hoje avaliado por aquele portal alemão em 80 milhões. Giménez, contratado aos uruguaios do Danúbio por 900 mil euros, vale hoje 56 milhões. Griezmann, que ele foi buscar à Real Sociedad por 54 milhões de euros, saiu no final da época passada para o FC Barcelona por 120 milhões. Rodri, resgatado ao Villarreal CF por 25 milhões de euros, foi transacionado um ano depois para o Manchester City por 70 milhões. Lodi parecia uma excentricidade, quando chegou, por 20 milhões, do Athletico Paranaense, mas menos de um ano depois, tendo-se afirmado como titular absoluto, já está avaliado em mais de 30 milhões.


Claro que entre os muitos negócios firmados pelo diretor desportivo italiano estão casos em que ele não se saiu tão bem. Basta lembrar os casos de Lemar, contratado ao AS Mónaco por 70 milhões e desvalorizado para 24 numa época apenas. Ou Diego Jota, que ele deixou saiu para o Wolverhampton WFC por 14 milhões, mas entretanto já vale 28. É curioso que ainda assim que em três dos sete anos em que Berta esteve a cargo do mercado, o Atlético – que por ser do primeiro mercado é um clube mais comprador do que vendedor – tenha realizado mais em transferências do que aquilo que gastou. Ou que, feitas as contas a esses sete anos, o Atlético tenha gasto 907 milhões de euros em jogadores, recolhendo 829 milhões em vendas. Ao todo, num período de sete épocas em que ganhou uma Liga espanhola, uma Liga Europa, uma Supertaça Europeia e jogou duas vezes a final da Champions, o Atlético investiu 80 milhões de euros em jogadores. É um bom ratio e isso também há-de ser mérito de quem lhe comanda o mercado ou a razão para que, mesmo apontando-lhe a falta de um goleador que se responsabilize pelos 30 golos de Griezmann, Simeone goste de o ter por perto.