Mais do que em qualquer outra das grandes ligas europeias, sempre que algum jogador novo e de perfil particularmente técnico chega a Inglaterra, uma onda de comentários se levanta: “É uma liga muito física, não vai ser fácil para ele”, diz-se em uníssono. Nem Lionel Messi escapou a esse tipo de comentários no período em que foi sendo apontado como reforço do Manchester City. Mas foi James Rodríguez o mais recente protagonista desta questão. A polémica levou mesmo Carlo Ancelotti, treinador do Everton, que contratou o colombiano, a encolher os ombros e a desabafar: “Se estivesse preocupado com isso tinha contratado antes o Usain Bolt”. Mas, afinal, será a Liga Inglesa tão mais física do que as restantes ligas do top-5 europeu? Os números diz que não, bem pelo contrário.
O fim de semana passado trouxe de volta a Premier League e, com ela, dois trunfos de ouro para a discussão. Kai Havertz considerou que a competição é muito mais dura do que a Bundesliga e disse que o percebeu isso logo nos treinos do Chelsea, enquanto Timo Werner assinalou que nunca, na carreira, tinha defrontado três defesas centrais tão altos e tão massivos como aqueles que encontrou no Amex Stadium, no jogo contra o Brighton & Hove Albion. O alemão referia-se a Adam Webster (1,85m), Ben White (1,82m) e Lewis Dunk (1,92m), o que não deixa de ser estranho já que quando defrontou o Borussia Dortmund pela primeira vez na temporada passada, por altura da 16ª jornada da Bundesliga, encontrou pela frente um trio defensivo composto por Mats Hummels (1,91m), Dan-Axel Zagadou (1,96m) e Manuel Akanji (1,87m), um trio de defesas centrais ainda mais altos e massivos do que os do Brighton. E essa nem seria a linha defensiva mais alta da competição: o “título” pertenceria à do Union Berlim, que em Hubner, Subotic, Shlotterbeck e Friedrich não tem qualquer central com menos de 1,92m.
Não é pela média de alturas que a Premier League pode assumir o título de liga mais física do Mundo. Da última vez que o CIES Football Observatory publicou um relatório relativo às médias de alturas das equipas participantes em ligas do futebol europeu (outubro de 2017), apenas duas equipas inglesas estavam entre as cinquenta com a maior média de alturas entre as participantes nas 36 divisões do futebol europeu analisadas. Por outro lado, cinco eram equipas alemãs. Havia ainda quatro italianas, duas francesas e nenhuma espanhola. Já em junho de 2019, a mesma instituição dava a conhecer que a média de alturas da Bundesliga era superior à da Premier League: 183,63 cm contra os 182,29 da liga inglesa, sendo que a Serie A italiana até se intrometia pelo meio com uma média de 183,20 cm. França ficava-se pelos 181,81 cm e, Espanha, a última das Big-5, com 181,05 cm. No Top-10 de equipas mais altas em junho de 2019, três eram alemãs (VfL Wolfsburgo, TSG Hoffenheim e Schalke 04), não se contando a presença de outra equipa das cinco principais ligas europeias entre as dez mais altas do continente.
Naturalmente não é apenas um indicador que determina qual a liga mais física do Mundo. Olhemos então aos dados que temos à nossa disposição: duelos defensivos, duelos aéreos, intensidade dos duelos (já explicamos), passes permitidos por ação defensiva, faltas e passes/corridas progressivas. E comparemos as grandes ligas para se perpetuar/dismistificar o facto da Liga Inglesa ser, ou não, a liga mais física. Comparemos ainda os dados que são públicos relativamente à distância percorrida pelas equipas na Premier League e na Bundesliga. Quem tem razão? Ancelotti ou as novas coqueluches do Chelsea?


Olhamos então, primeiro, aos duelos defensivos disputados pelas equipas das principais divisões do futebol europeu. Não só em termos totais Inglaterra não tem a competição cujas equipas disputaram mais duelos em média – foi em Itália, com os números franceses a ressentirem-se da interrupção da competição -, como foi mesmo em França que se registou a maior média por jogo de duelos defensivos disputados. Na verdade, só mesmo em Espanha se disputaram menos duelos defensivos por cada 90 minutos face ao que aconteceu em Inglaterra na temporada passada.


Um dos dados mais curiosos da análise prende-se com os duelos aéreos disputados, já que foi em Espanha que na temporada passada mais foram registados, quer em média total, quer em média por 90 minutos. Apesar de ser sempre associada a um estilo de futebol mais térreo e pouco dado à bola pelo ar, foi mesmo a Liga espanhola que mais duelos aéreos proporcionou, tendo sido em Itália, de muito longe, que a bola menos tempo passou no ar. Aqui, Inglaterra já surge como a segunda competição em que mais duelos aéreos foram disputados.


Seguimos então com a intensidade dos duelos. O que é isto? Pois bem, o número de duelos, tackles e interceções efetuados por cada equipa por cada minuto de posse de bola adversária. É, geralmente, um dos indicadores chave para perceber a intensidade defensiva de uma equipa, a intensidade da sua pressão e se uma equipa é muito agressiva na procura pela bola após perda ou se prefere reorganizar-se atrás e fechar-se pacientemente enquanto o adversário tenta o seu ataque posicional.
Também aqui, Inglaterra não domina o ranking. Tanto na Alemanha como em Espanha as equipas procuram recuperar a bola de forma mais agressiva e tentam mais ações defensivas por cada minuto de posse de bola adversária. Só em Itália e em França são disputados menos duelos por cada minuto de posse de bola adversária do que em Inglaterra. Sem surpresa, a Alemanha lidera o ranking: afinal, é o país berço do futebol heavy-metal e do gegenpressing tão em voga no futebol atual.


Outra das métricas importantes na altura de analisar a agressividade e intensidade do momento defensivo de uma equipa e da intensidade/agressividade da sua pressão é o PPDA, isto é, os passes permitidos ao adversário por cada ação defensiva efetuada. Regra geral, quanto menor for o número, mais agressiva é a equipa no seu momento defensivo, ainda que possa também significar uma grande passividade no seu momento defensivo, devendo por isso ser sempre usada em conjunto com outros indicadores nomeadamente o “challenge intensity”.
Surpresa das surpresas: Inglaterra é o país em que são permitidos mais passes ao adversário por ação defensiva. Ou seja, a generalidade das equipas não procura condicionar a construção ofensiva adversária ou, se o tenta, é muito pouco eficaz a fazê-lo, já que não consegue protagonizar uma ação defensiva no momento inicial da construção adversária, fazendo isso subir o número de passes permitidos aos adversários. É em Espanha e na Alemanha, mais uma vez, que são permitidos menos passes aos adversários por cada ação defensiva efetuada, sintomático das pressões agressivas que são feitas pelas equipas desses países.


O número de faltas é um indicador mais subjetivo, mas olhemos para ele na mesma. Se é certo que depende muito do critério de arbitragem de cada uma das competições – e já sabemos que em Inglaterra há o “mito” de que os árbitros tendem a ser mais permissivos -, não deixa de ser um indicador importante na transmissão de algumas sensações. E, aqui, mais uma vez, Inglaterra surge como o país em que são marcadas menos faltas. A diferença substancial para as restantes competições não pode/deve ser unicamente explicada pelo critério, mas vamos dar esse desconto.


Porque é que olhamos para os passes progressivos? Primeiro, para estabelecer uma comparação direta com as corridas progressivas e partindo do princípio que há uma componente mais física em competições onde se corre mais, e uma mais técnica em competições em que se fazem mais passes e a bola troca mais de pé para pé, e não é tão conduzida pelos jogadores. Ou seja, se a progressão das equipas em campo é feita de forma mais física, ou mais técnica. Números elevados de passes progressivos tendem a significar que existe mais “intensidade” ofensiva e por consequência mais correria, já que números mais baixos tendem a significar uma construção mais paciente, lá está, menos progressiva, e por isso um futebol mais mastigado. Não é, por isso, surpresa, que seja em Espanha que se registam os números mais baixos em termos de passes progressivos por 90 minutos e seja na Alemanha que esses números sejam mais elevados, já que a velocidade a que se joga na Bundesliga é avassaladora, por vezes.


Também não é em Inglaterra que mais se corre com a bola. Curiosamente é mesmo em Itália e, sem tanta surpresa, em França. Menos surpreendente ainda é o facto de Espanha ter a menor média de corridas progressivas por 90 minutos, o que aliado aos dados relativos aos passes progressivos é sintomático da culturalidade existente, ainda muito marcada por aquilo que foi o FC Barcelona de Pep Guardiola. Mesmo os números alemães não são totalmente surpreendentes, já que basta vermos um jogo da Bundesliga para perceber que apesar da velocidade com que as equipas chegam ao último terço, isso acontece mais pelo passe, do que pela corrida, como aliás já tínhamos visto anteriormente.
Não é só defensivamente que se percebe a intensidade de uma competição. A forma como as equipas atacam diz muito acerca da fisicalidade da mesma. Se há mais passes longos a tendência é que existam mais duelos aéreos e duelos defensivos a serem disputados. Se há mais passes para o espaço a tendência é que exista mais correria para chegar a essas bolas. Se há mais ou menos passes por cada minuto de posse de bola isso vai ditar a velocidade a que o jogo é disputado e, por consequência, se ele é mais físico ou mais técnico. É, por isso, importante, olhar ainda para outros indicadores relativos aos passes como os passes longos, os passes para o espaço e ainda os passes feitos por minuto de posse de bola.


A Liga Francesa foi então a competição com a maior média de passes para o espaço por 90 minutos, seguido da Alemanha e só depois de Inglaterra. Itália e Espanha, sem tanta surpresa, foram as ligas em que mais se jogou de pé para pé e menos para o espaço, obrigando por isso a menos correria para alcançar os passes efetuados pelos colegas de equipa.


Já no que aos passes longos diz respeito, Espanha foi surpreendentemente a segunda liga do Top-5 na temporada passada cujas equipas efetuaram mais passes dessas características. Só na Bundesliga se efetuaram mais passes longos, em média, do que em Espanha, com Inglaterra a surgir na terceira posição. Já nem o “kick & rush” é típico em Inglaterra, tendo sido de longe, em Itália, que se jogou o futebol mais apoiado na temporada passada.


Por fim, olhamos para o “passing rate”, isto é, para o número de passes efetuados por cada minuto de posse de bola e também aqui há números surpreendentes. Apesar de parte das equipas da Liga Espanhola terem construções bastante pacientes, a existência de várias outras (Getafe CF, Alavés, Granada CF, SD Eibar, Osasuna e CD Leganés à cabeça) que não querem nada com a posse de bola acaba por fazer da La Liga a competição com a menor média de passes por minuto de posse de bola. Por outro lado, mesmo numa construção tão progressiva como é a da generalidade das equipas da Bundesliga, a Liga Alemã acabou por ser a segunda competição cujas equipas fizeram em média mais passes por minuto de posse de bola. Em teoria, recorde-se, quanto mais passes por minuto de posse se fazem, mais lenta e mastigada é a construção ofensiva da equipa.
Ranking final:


Ou seja, em conclusão, olhando aos vários indicadores analisados parece ser cada vez mais abusivo considerar-se a Premier League como a competição mais exigente do ponto de vista físico, na atualidade. Sem surpresa, até para quem simplesmente recorre ao pragmatismo do “teste do olho”, é a Alemanha que se destaca nas componentes mais físicas do jogo e só surpreende que tanto Kai Havertz como Timo Werner não tenham perdido tempo a enveredar pelo discurso típico dos adeptos de futebol. Nada como puxar a brasa à sua sardinha, não é verdade? É que nem no número de jogos disputados a Premier League se destaca, já que apesar do calendário apertado durante a época festiva (e à qual estamos longe de chegar), o número de jogos totais são os mesmos de Itália, França e Espanha.
E, se duvidas existem ainda, olhamos para o número de quilómetros percorridos pelas equipas alemãs e inglesas na temporada passada, em média, por jogo (os dados da Premier League foram tornados públicos à 29ª jornada). Os números são elucidativos. A equipa que menos distância percorreu em média, por jogo, na Bundesliga, correu mais do que a equipa que mais distância percorreu, em média, por jogo, na Premier League. No que aos registos de quem mais correu diz respeito, bom, não há sequer discussão. Por tudo isto, a Bundesliga leva o título de competição mais exigente do ponto de vista físico no top-5 europeu. Talvez seja altura de começarmos a mudar o discurso.
Liga Inglesa:


Liga Alemã:


e quando se diz que um campeonato e mais fisico, e porque a arbitragem deixa mais jogar os pequenos encostos os duelos aereos ate alguns cotovelos o apoio nos ombros nao sao apitados na inglaterra como é apitado em varios paises.desde logo na espanha quando um jogador salta e mete a mao nas costa e logo apitado mesmo se nao a carga nas costas .
muita estupidez na analise deste post. nao tem o ratio dos minutos jogados e parados e a analise dos duelos fisicos jogados e parados. O que determine o impacto fisico das equipas e o que os arbitros deixam. Porque se comparamos a Liga Francesa e INglesa os duelos aereos sao deixado jogados e muitos na franca sao apitadas . Mas o resto e obra so a analisa é de um footix sem nocão do impacto fisico nos duelos aereos e nos ombros vs ombros. que na inglaterra nao sao apitadas.