Fernando Santos irritou-se ontem, porque só lhe perguntavam acerca de Cristiano Ronaldo e, em contrapartida, ninguém quis falar-lhe de Andriuskevicius ou Kazlausakas. Também não era seguro que ele quisesse dizer alguma coisa de pertinente acerca dos autores dos dois últimos golos da Lituânia nesta fase de qualificação, em que os bálticos serão certamente últimos classificados do Grupo B. A insistência em Ronaldo por parte dos jornalistas tem a ver com o valor-notícia e é a mesma que seguramente Ryan Giggs vai ter de enfrentar a propósito de Gareth Bale, que apareceu em pleno nos treinos de Gales depois de semanas de baixa em Madrid. E a questão é que há momentos na carreira de um jogador em que a seleção é o contexto certo – como esse parece ser, neste momento, o caso de Ronaldo, a Fernando Santos só lhe resta aproveitar. E entender.
A FPF protegeu Ronaldo, não o colocando à frente dos jornalistas esta semana, depois do caso da substituição frente ao Milan. Uma substituição à qual o jogador reagiu mal, mas que Maurizio Sarri, treinador da Juventus, justificou com os imensos problemas físicos pelos quais passava o jogador, que estaria a atuar com dores e um sacrifício pessoal imenso. Perante essa realidade e constatando que o jogo com a Lituânia, sendo fundamental para a qualificação portuguesa, terá um grau de dificuldade mínimo e não justifica minimamente que se arrisque a condição física do capitão e melhor jogador da seleção, incompetentes seriam os jornalistas se não confrontassem o selecionador com a questão: afinal Ronaldo está em sofrimento, como diz Sarri, ou está em pleno e vai jogar? A insistência no tema deveu-se apenas ao facto de a resposta – até por educação e falta de vontade de entrar em confronto – nunca ter sido verdadeiramente convincente.
De qualquer modo, tendo Santos poupado Ronaldo, por exemplo, a toda a primeira fase da Liga das Nações, há um ano, por ter a noção de que o jogador caminha para a veterania e precisava de pausas para respirar na sua agenda, é legítimo concluir que se Ronaldo vai jogar hoje é porque está em perfeitas condições. E que, portanto, também Sarri optou por uma mentira piedosa quando justificou a substituição do jogador-bandeira com questões físicas – e não deixa de ser curioso que quando os protagonistas mentem ou fogem às perguntas, os maus são os jornalistas, que insistem nas questões, mas isso são contas de outro rosário… A verdade é que Portugal vai ter Cristiano Ronaldo para os dois jogos que faltam para carimbar a presença na fase final do Europeu de 2020 e isso são boas notícias, mais ainda se o capitão sentir que precisa de provar que está bem. Sabe-se bem que se há músculo que Ronaldo tem mais desenvolvido que qualquer outro é o do orgulho.
Com Ronaldo presente e, tendo em conta a inflação de avançados-centro na convocatória de Fernando Santos, é legítimo pensar que pelo menos um deles acompanhará o capitão no ataque, permitindo-lhe alinhar a partir da esquerda, como ele tanto gosta – e que contra a Lituânia ou o Luxemburgo não apresentará perigo em momentos de transição defensiva. Há André Silva, primeiro na hierarquia, mas há ainda Éder, o do golo na final do Europeu de 2016, e Gonçalo Paciência, autor de um início de época a justificar uma oportunidade na seleção. Além de que para jogar a partir da esquerda ainda há Bruma, Podence ou Diogo Jota. Tanta gente que parece legítimo admitir que Ronaldo não acabe o jogo e Santos pisque o olho a Sarri fazendo-o sair lá mais para o meio da segunda parte. Se e quando o resultado estiver confortável, como é evidente.