Houve duas frases desconcertantes na cerimónia da entrega da Bola de Ouro do France-Football, ontem, no Teatro Châtelet, em Paris. A primeira pertenceu a Kylian Mbappé, que disse que Messi tinha animado a noite entre eles, os jogadores – o que claramente contradiz o ar mais uma vez tímido e envergonhado do argentino na altura de receber pela sexta vez o troféu que melhor simboliza a condição de melhor do Mundo. A segunda foi do próprio Messi, quando ele começou a falar em “retirada”. “Valorizo muito mais este prémio porque estou consciente da idade que tenho e de que se aproxima o momento da retirada”, afirmou Messi, assumindo uma finitude claramente em contradição com o rendimento que ainda demonstra em campo. A entrega de uma Bola de Ouro a um talento como Messi – ou Ronaldo – terá sempre motivos suficientes para o justificar. O resto é a narrativa de que se fazem as lendas: e essa também teve mais episódios ontem.
Apesar da ausência de títulos coletivos internacionais, o ano de Messi foi deslumbrante – disso, não há dúvidas. Ao contrário, Cristiano Ronaldo até ganhou uma Liga das Nações com a seleção portuguesa, mas vive um momento conturbado, no qual a falta de química com o novo treinador da Juventus, Maurizio Sarri, terá a sua importância. O facto de Portugal ter perdido na Ucrânia a possibilidade de ser primeiro do grupo de apuramento para o Europeu de 2020, de a Juventus estar atrás do Inter na tabela da Série A, de Ronaldo ter estado abaixo do seu habitual na fase de grupos da Liga dos Campeões – só um golo marcado – e de ter interrompido no domingo, frente ao Sassuolo, de penalti, um jejum que já durava há mais de 380 minutos sem marcar pelo clube também não terá ajudado a campanha em prol de jogador português. Por muito que se cuide, o próprio Ronaldo, que é dois anos mais velho, também terá consciência da sua própria finitude – e isso contribuirá mais ainda para a amargura de ver o rival de sempre escapar na luta particular. E o tempo para recuperar a esgotar-se: é quase como sofrer um golo aos 90′ e achar que tem de se aproveitar o período de compensações para pelo menos empatar a partida.
Ronaldo tinha, desta vez, uma justificação plausível para a ausência em Paris e, se estive entre os que o criticaram quando faltou à Gala da FIFA, desta vez não compreendo as indiretas de gente como Modric ou van Dijk: estava, ao mesmo tempo, a receber o prémio de melhor jogador da Série A, na Gran Gala del Calcio, em Milão. Aqui não há prémios mais e menos importantes. Há prémios que se ganham e prémios que não se ganham. E, no que ganhou, o português apresentou-se sorridente, solto, ainda que seja normal que por dentro preferisse receber o outro, o que Messi levou para casa. E que, competitivo como é, esteja já à procura da melhor estratégia para voltar a igualar o argentino no duelo particular, que neste momento perde (5-6). É que enquanto Messi falou de “retirada” e de amor ao clube de sempre, o FC Barcelona, Ronaldo mencionou o muito que foi aprender por ter voltado a trocar de país (saiu de Espanha para Itália) e fixou o discurso no ano que aí vem: “Esta época vou tentar dar tudo para voltar a vencer o prémio”, afirmou o português em Milão, a propósito do que acabara de garantir, mas possivelmente a pensar no outro, o verdadeiramente relevante. Mesmo tendo seguramente a noção de que, para já, as coisas não estão a correr-lhe de feição.
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