Não há nada que mais entusiasme os adeptos de futebol do que o anúncio de reforços. E no entanto, não é aí que está o segredo da gestão em futebol. No domingo, estava a ver a forma como o Liverpool FC vulgarizou o campeão permanente do mercado, que é o Manchester City, com uma vitória por 3-1 que deixou a equipa de Pep Guardiola a nove pontos, e a pensar que estas coisas se fazem em duas fases. Primeiro, sim, o reforço do plantel. Mas depois, fundamental, a sua consolidação. O melhor arranque da história dos reds na Premier League, com onze vitórias e um empate, funda-se na estabilidade e assimilação de processos de uma equipa que já tinha qualidade e na qual não valia a pena mexer. E é nessa altura que é preciso saber resistir.
O onze apresentado por Jürgen Klopp de início frente ao Manchester City incluía apenas um jogador formado em casa, o lateral-direito Alexander-Arnold, mas o último a chegar a Anfield entre os outros dez titulares foi o guardião Alisson, contratado à AS Roma no verão de 2018. Há 16 meses, portanto. Antes dele, no inverno de 2017/18, tinham chegado o central van Dijk e o médio Fabinho. E antes, no verão de 2017, Robertson e Salah. Todos os outros – e são a maioria – já têm mais de três anos de clube. A conquista da Liga dos Campeões, em Maio, ajuda a explicar a aposta neste coletivo por parte de uma gestão que, no último defeso, fez só três contratações: o jovem central Sepp van den Berg, de 17 anos, que chegou do PEC Zwolle para aprender, e os veteranos guarda-redes Adrián (ex-West Ham) e Lonergan (ex-Middlesbrough), ambos a custo zero, para servirem de alternativa a Alisson. Custo total das três operações de mercado: 1,9 milhões de euros.
Claro que seria falso estar agora a defender que o Liverpool FC é um clube que não investe e que funda na sovinice os seus sucessos. Ao todo, nos dez titulares de domingo que foi buscar ao mercado, o clube gastou 400 milhões de euros – e muito se criticou, por exemplo, o montante (84 milhões de euros) investido na altura em que Klopp foi buscar van Dijk ao Southampton, por exemplo. Mas chegou a um ponto em que o treinador ficou satisfeito com a equipa e tratou de a fazer evoluir dentro daquilo que são os seus métodos e processos de jogo. Os resultados estão à vista – já poucos admitem que o Liverpool FC possa perder a hipótese de se sagrar pela primeira vez campeão da Premier League, uma vez que o último título nacional do clube ainda é anterior à criação da competição (foi em 1990). E isso deve permitir ao treinador centrar atenções na Champions.
Também seria ingénuo pensar que este modelo possa ser replicado em Portugal. Por uma razão muito simples – o segredo passa pela capacidade para manter o talento e isso será uma impossibilidade para a generalidade dos clubes portugueses que revelam jogadores maiores do que as fronteiras do país e do nosso futebol. Qualquer craque que se destaque num grande de Portugal torna-se imediatamente cobiçado no estrangeiro, onde os salários são maiores e onde as perspetivas de ganhar títulos internacionais é também superior. Mas é aqui que é preciso saber distinguir entre a necessidade de vender, seja porque o jogador vale mais do que se pode pagar por cá ou porque o clube precisa dessas mais-valias para equilibrar o seu orçamento, e a vontade de vender, para satisfazer a clientela, sobretudo os empresários, que depois “ajudam” a recompor o plantel. No dia em que os nossos clubes equilibrarem esta balança, estarão bem mais próximos do sucesso.