Após a derrota do Benfica no Dragão, contra o FC Porto, foi relativamente fácil a quem vê futebol numa perspetiva exclusivamente individual pôr em causa a contribuição de Ferro para a falta de solidez defensiva do Benfica. Da mesma forma que já se coloca em causa a chegada de Weigl, porque coincidiu com o momento em que os encarnados começaram a sofrer golos em catadupa. Acontece que o jogo não só é coletivo como é uno entre momentos defensivos e ofensivos e, tal como veio reforçar Bruno Lage, na conferência de imprensa de antecipação da meia-final da Taça de Portugal, contra o FC Famalicão. E, embora seja mais ou menos claro que falta ao Benfica mais uma opção credível para a posição de defesa-central – pelo menos na medida em que lhe sobra noutras zonas do campo – a verdade é que a questão é muito mais complexa.
Continuo convencido de que Lage fez mal em trocar Cervi por Chiquinho no onze para o Dragão e de que aí começou parte do desequilíbrio que – e não é preciso ser um génio a descodificar futebol – tem quase sempre origem no flanco esquerdo encarnado. Os campos de futebol têm todos uma área relativamente semelhante e as equipas jogam, pelo menos de início, sempre com onze jogadores, pelo que o segredo para se ser eficaz perante qualquer adversário passa por entender onde ele ocupa e onde não ocupa os espaços. Ora, no Benfica, o espaço está quase sempre nas costas do lateral esquerdo, num espaço que o defesa-central desse lado é frequentemente chamado a compensar. Nada a fazer? Claro que não. Ouçamos Lage: “não é uma questão individual nem da linha defensiva, mas sim uma questão coletiva, que se resume a sermos efetivos na pressão que fazemos”.
Descodificado? Se boa parte da ameaça atacante do Benfica passa pela projeção ofensiva de Grimaldo, a equipa não vai deixar de jogar assim e é inevitável que o espaço lá esteja. Logo, a melhor forma de evitar que o adversário o aproveite é ser eficaz na pressão em momentos de transição defensiva e impedir que a bola lá entre. Daí a importância de lá ter um jogador como Cervi, intenso defensivamente. Visto à posteriori, o erro de Lage no Dragão foi achar que precisava de um meio-campo a três, não podendo, por isso limitar-se a trocar Chiquinho por Rafa, dando o corredor central a este, que não baixa tanto e se assume mais como segundo avançado, até para aproveitar passes de rotura e chegadas à área no apoio a Vinícius. E por que o terá feito? Talvez para libertar Weigl e dar-lhe melhores condições para pautar o jogo ofensivo do Benfica.
É que quem faz a associação da chegada de Weigl ao aumento da permeabilidade defensiva da equipa – oito golos sofridos em seis jogos com o alemão em campo – tem razão e, ao mesmo tempo, também não a tem. Porque apesar de ser um “seis”, Weigl não é um médio-defensivo. Tal como a generalidade dos jogadores que atuam naquela posição em equipas que jogam para ganhar campeonatos, o alemão é mais importante pela forma como faz girar a bola e inicia a organização ofensiva do que pelo modo como defende. Não faria sentido tê-lo ali para andar a correr atrás do segundo avançado do adversário. E, tal como já sucede com Grimaldo – um lateral bem melhor a atacar do que a defender –, estas caraterísticas implicam a devida compensação por parte da equipa.
Em conclusão, o que os resultados mostram é verdade: este Benfica está com maior balanço ofensivo e menor eficácia a defender. É claro que faria falta uma opção mais válida para uma posição – a de defesa-central – em que, mesmo podendo adaptar Weigl ou Samaris, Lage tem apenas Rúben Dias, Ferro, o lesionado Jardel e o miúdo Morato. Por comparação com outras zonas do campo, onde há muito mais abundância (e veremos quantos minutos fará, por exemplo, o terceiro dos avançados com que a equipa acabou o jogo no Dragão), o centro da defesa está depauperado. Ferro fez um mau jogo no Dragão, é verdade. Tão mau como o de Grimaldo, por exemplo. Mas centrar os problemas defensivos da equipa naquilo que faz Ferro é um erro próprio de quem vê o futebol numa perspetiva exclusivamente individual.