O normal é que os operadores sintam também os efeitos da crise que, para eles, já começou. Pagam – e não pagam pouco – por um produto que depois revendem aos interessados nos canais de Pay TV, sendo que se deixam de ter produto o mais normal é também que deixem de ter interessados. É por isso que o Canal Plus – e a BeIn Sports deve seguir-lhe o exemplo – quer deixar de cumprir o acordo com a Liga francesa. E que, em Itália, o consórcio formado por Sky, Dazn, Rai e Img já tenha feito saber que o cumprimento da última prestação do seu contrato com a Série A (e não é coisa pouca, são 340 milhões de euros) dependerá de vir a ter mesmo os 306 jogos em direto que estavam contratualizados para toda a época (à data da interrupção ainda faltavam 50). Ou que, diz o Daily Mail, a Sky Sports inglesa e a BT Sport já estejam a estudar a possibilidade de processar a Premier League num valor de 42 milhões de euros por cada um dos 20 clubes envolvidos na competição: são 840 milhões mais coisa menos coisa.
Além disso, o peso da austeridade – que já tínhamos visto iria afetar seriamente o mercado de transferências e os clubes que dependem de mais-valias aí alcançadas para poderem viver no lado positivo das contas – não se resumirá apenas aos valores que ficarão por saldar. A Bundesliga, por exemplo, viu-se forçada a adiar o concurso para venda dos direitos televisivos para o próximo triénio. E a Ligue 1 pensa seguir-lhe as pisadas, pois está a chegar a altura de vender as próximas quatro temporadas. É normal que, nas condições que o futebol vive neste momento, todos estes concursos acabem por ser adiados e depois arrematados com valores em baixa: quem é o operador que quer arriscar pagar tanto como anteriormente se a incerteza cai sobre o futebol e a sua capacidade para cumprir acordos da forma mais básica possível, que é jogando?
Tal como em tudo o resto, o futebol português acabará também por ser afetado. Por cá, aliás, a maior parte dos operadores de cabo já anunciou que enquanto durar a quarentena deixam de cobrar pelos canais codificados, o que naturalmente lhes vai pesar nos cofres. Acumularão em capital-simpatia o que perdem em receita, pois sabem que só a inércia levaria clientes a continuar a pagar por um serviço que eles foram impossibilitados de prestar. Só que a Liga portuguesa tem várias originalidades, a começar pelo facto de as negociações, aqui, serem feitas clube a clube e não centralizadas. Ora isto tem efeitos nocivos em condições normais, não apenas na distribuição da receita como na capacidade negocial, que seria maior se em conjunto, mas introduz uma questão difícil de avaliar nesta conjuntura de crise. Poderão os operadores pagar a uns, os que têm mais peso negocial, e deixar outros a ver a banda passar? E o que farão com os que já anteciparam as receitas e agora não estão em condições de cumprir a sua parte do acordo?
Os próximos dias trarão desenvolvimentos.
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